É impossível ver as notícias sem uma profunda tristeza. Uma tremenda revolta.

Crianças a morrer à fome, não porque seja impossível fazer chegar alimentos, mas porque os camiões de ajuda humanitária são impedidos de entrar em Gaza pelo Exército israelita.

Dois milhões de pessoas cercadas por um dos mais avançados Exércitos do mundo. Impedidas de fugir das bombas, de receber comida, água, medicamentos. Faz lembrar a barbaridade de um cerco medieval.

Depois de mais de 30 mil mortos e 70 mil feridos, não está em jogo qualquer direito de Israel à autodefesa. É pura retaliação. Só que não é contra o Hamas, é contra todo o povo palestiniano.

É até mais do que retaliação. É um projeto político de destruição e subjugação.

Netanyahu gabou-se de os seus Governos terem tornado inviável a solução dos dois Estados, que era o elemento central dos Acordos de Oslo para trazer paz a uma região martirizada por décadas de conflitos.

Fê-lo com a construção de colonatos na Cisjordânia. Ilegais de acordo com a lei internacional, há atualmente cerca de 300 colonatos, onde residem 700 mil israelitas, protegidos por altos muros, elevado número de tropas e centenas de postos de controlo militares onde os palestinianos podem ser arbitrariamente detidos para interrogatório. Tornam a viabilidade de um Estado Palestiniano cada vez mais remota e a vida dos três milhões de palestinianos da Cisjordânia cada vez mais difícil.

Fê-lo também através do fortalecimento do Hamas em Gaza, que o Governo israelita facilitou como forma de manter a cisão entre os palestinianos. Com o Governo da Autoridade Palestiniana a mandar apenas na Cisjordânia, a sua liderança não tinha força política para representar todos os palestinianos em qualquer negociação.

É por ter permitido o crescimento do Hamas e pela trágica falha de segurança que os ataques de 7 de Outubro representaram que hoje há uma larga maioria de israelitas contra Netanyahu. É bastante claro que haverá enormes mudanças políticas assim que a guerra acabar. E esse é mais um motivo para o prolongar da guerra.

Por outro lado, apesar de todos quererem a destruição do Hamas, há cada vez mais israelitas contra o massacre que está a ocorrer em Gaza. E o Governo de Israel sabe que está a perder o apoio do resto do mundo. Os próprios EUA, os maiores apoiantes de Israel, apelam a um cessar-fogo imediato.

Os mantimentos que chegaram pelo ar são apenas uma gota comparada com as necessidades. As 200 toneladas que uma ONG conseguiu fazer chegar de barco parecem muito... mas se fizermos as contas não passa de 100 gramas por habitante. É preciso mais, muito mais.

O porto temporário que os EUA anunciaram deverá demorar cerca de dois meses a ser construído, pelo que são necessárias respostas mais imediatas. Só a abertura de corredores humanitários terrestres poderá evitar milhares de mortes à fome.

Entretanto, o Governo de Israel defende-se dizendo que não impede a entrada de alimentos, mas isto não é verdade. A esmagadora maioria dos camiões são barrados na fronteira. Israel está hoje a defender-se da acusação de genocídio que o Tribunal Internacional de Justiça considerou plausível.

Para um país fundado devido ao genocídio do seu povo na II Guerra Mundial, a condenação por genocídio seria uma derrota moral devastadora.

Israel perde a cada dia a legitimidade moral, mas os palestinianos estão a perder a vida...

Revolucionou o humor em Portugal na década de 80, influenciou uma sociedade que se abria progressivamente, e teve sempre uma qualidade e profissionalismo que lhe assegurou a estima dos portugueses.

Anteontem, dia em que completou 70 anos, Herman recebeu das mãos do primeiro-ministro, António Costa, a Medalha de Mérito Cultural.

Como dizia numa frase que ficou famosa: “O artista é um grande artista.”

QOSHE - Um cerco medieval - Pedro Marques
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Um cerco medieval

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21.03.2024

É impossível ver as notícias sem uma profunda tristeza. Uma tremenda revolta.

Crianças a morrer à fome, não porque seja impossível fazer chegar alimentos, mas porque os camiões de ajuda humanitária são impedidos de entrar em Gaza pelo Exército israelita.

Dois milhões de pessoas cercadas por um dos mais avançados Exércitos do mundo. Impedidas de fugir das bombas, de receber comida, água, medicamentos. Faz lembrar a barbaridade de um cerco medieval.

Depois de mais de 30 mil mortos e 70 mil feridos, não está em jogo qualquer direito de Israel à autodefesa. É pura retaliação. Só que não é contra o Hamas, é contra todo o povo palestiniano.

É até mais do que retaliação. É um projeto político de destruição e subjugação.

Netanyahu gabou-se de os seus Governos terem tornado inviável a solução dos dois Estados, que era o elemento central dos Acordos de Oslo para trazer paz a uma região martirizada por décadas de........

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