Como óbvio liberal que - perceberão facilmente os que têm paciência para ler o que aqui assino - sou, longe de mim está qualquer ideia de pensamento único. No entanto, factos (científicos) são factos, pelo que a realidade impõe-se, sempre, independentemente das opiniões, desejos ou sonhos das pessoas.

No entanto, muitos políticos - alguns intencionalmente, outros por negligência, a maioria, quero acreditar, apenas por incompetência, incapacidade ou estupidez - preferem não olhar de frente para o mundo como ele é, mantendo-se agarrados a ideologias que a História já mais do que demonstrou serem fracassadas, ou apontando caminhos irrealistas sem querer saber das suas consequências.

Os resultados são, quase sempre, desastrosos. Alguns exemplos:

• Pânico ambiental. A ideia de que o “Planeta está a arder”, como tem feito questão de referir em praticamente todos os discursos sobre o tema o atual secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, tem apenas servido para alimentar a convicção de alguma juventude de que o mundo vai acabar em 30 ou 40 anos. Depois vão partir montras e cortar estradas, de telemóvel na mão, a fazer upload dos vídeos para a nuvem de empresas fruto do capitalismo que dizem desprezar. Objetivamente, nem se percebe onde quer chegar o líder da ONU com esta retórica, não sendo achar que fica bem na fotografia. Afinal, os líderes industriais e de Estado responsáveis bem sabem qual é a realidade - e são os primeiros a investir para mitigar os problemas. Os outros, simplesmente, ignoram-no. Ou pior...

• Nuclear não. A desinformação acerca da energia gerada por centrais nucleares deveria ser alvo de estudos académicos multidisciplinares. O pânico quase subconsciente instalado na maioria das pessoas sempre que se fala do assunto toca a irracionalidade. Não adianta explicar-lhes que o acidente de Chernobyl foi resultado de um erro básico de conceção, escondido dolosamente pela cúpula comunista da URSS (como aliás é bem explicado na incrível minissérie da HBO), ou que o desastre de Fukushima aconteceu porque se abateu ali um sismo sem quase paralelo no mundo (e os danos foram contidos de forma exemplar). Se há um erro verdadeiro a apontar, de conceção do reator, é o de Three Mile Island, nos EUA, que libertou uma nuvem de gás radioativo - este, curiosamente, pouco referido deste lado do Atlântico... E estamos sempre a falar de tecnologia com mais de 60 anos. Hoje existe forma de criar reatores muitíssimo mais seguros e eficientes, controlados através da mais moderna tecnologia digital, e que inclusivamente “reciclam” o lixo atómico das velhas instalações. Esta seria - a Comissão Europeia assume-o, aliás - uma das mais viáveis formas de gerar energia sem interrupções (ao contrário do atual solar ou do eólico) para o próximo século, mas na qual não se investe por receios da opinião pública desinformada.

• Justiça social sem crescimento. Achar que é possível redistribuição promovida pelo Estado sem preocupações de crescimento económico - como em Portugal promove a esquerda radical do PCP e do BE - sem que daí resulte, inevitavelmente, fuga de riqueza em massa do país e (no limite) proibições de saída de pessoas das suas fronteiras é uma quimera. Quanto à primeira questão, pelo menos os comunistas são até honestos ao assumirem que - disse-o recentemente o secretário-geral, Paulo Raimundo - “Portugal devia preparar-se para sair do euro”. E vivemos como, depois?! Relativamente ao segundo ponto, a História Universal já o respondeu: distribuir o que não há é distribuir pobreza. É sempre o que estas ideologias fizeram, à custa de quem quer trabalhar para criar mais-valia e riqueza. Mas e quem os valoriza, por cá?

• A dívida não se paga. Foi Paulo Macedo, atual presidente da CGD, quem um dia o disse de forma mais sintética: “A dívida [pública] de hoje são os impostos de amanhã.” O Estado - objetivamente, o Governo - não tem dinheiro próprio, é o dinheiro dos contribuintes; nós é que o entregamos às pessoas que estão nessas funções para que o giram e gastem, em nosso favor. Se eles precisam de pedir empréstimos hoje, os contribuintes de amanhã terão de pagar a dívida - ou os juros da mesma. A má gestão tem um preço que se acumula, numa bola de neve, cuja avalancha pode ser imprevisível. Convém recorrentemente lembrar que este é o único país da Europa Ocidental que, em 50 anos, teve de recorrer a três intervenções internacionais para não cair em bancarrota...

• Um país pequeno e pobre é muito dependente do Estado. É uma ideia que tem sido muito repetida por comentadores, ultimamente, neste contexto de instabilidade governativa. Mas não será exatamente ao contrário? Reflitamos: Portugal tem desde 1143 o tamanho que tem, pelo que a dimensão não se coloca. Mas, pelo menos nos últimos 500 anos, tem tido sucessivas vezes condições para ser um dos países mais ricos da Europa - e assim se manter. No entanto, nunca deixou de ser um dos países mais pobres do Velho Continente. O que nunca mudou, também, salvo num brevíssimo período, foi a enorme centralização do poder, incluindo o dirigismo económico - fosse na coroa, numa certa elite, no corporativismo, ou, hoje, nas decisões políticas. Em comparação, os países europeus que ao longo da História adotaram o laisser faire, laisser passer cresceram de uma forma que o seu pequeno tamanho não fazia prever. Incluindo intelectualmente. Portugal, berço de uma das primeiras universidades europeias, consegue não ter uma escola filosófica... Mesmo passando as agruras das várias guerras, a riqueza que sucessivas vezes aqueles países foram criando permitiu-lhes, já neste século, criar - pela democracia cristã, primeiro, e depois por outras vias - o Estado Social que Portugal tanto tenta imitar.

Como (quase) sempre, tentamos fazer a casa pelo telhado. E, como sempre, a realidade cai-nos em cima.

QOSHE - Mitos e desinformações que ajudam à pobreza (e ao pânico) - Ricardo Simões Ferreira
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Mitos e desinformações que ajudam à pobreza (e ao pânico)

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07.05.2024

Como óbvio liberal que - perceberão facilmente os que têm paciência para ler o que aqui assino - sou, longe de mim está qualquer ideia de pensamento único. No entanto, factos (científicos) são factos, pelo que a realidade impõe-se, sempre, independentemente das opiniões, desejos ou sonhos das pessoas.

No entanto, muitos políticos - alguns intencionalmente, outros por negligência, a maioria, quero acreditar, apenas por incompetência, incapacidade ou estupidez - preferem não olhar de frente para o mundo como ele é, mantendo-se agarrados a ideologias que a História já mais do que demonstrou serem fracassadas, ou apontando caminhos irrealistas sem querer saber das suas consequências.

Os resultados são, quase sempre, desastrosos. Alguns exemplos:

• Pânico ambiental. A ideia de que o “Planeta está a arder”, como tem feito questão de referir em praticamente todos os discursos sobre o tema o atual secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, tem apenas servido para alimentar a convicção de alguma juventude de que o mundo vai acabar em 30 ou 40 anos. Depois vão partir montras e cortar estradas, de telemóvel na mão, a fazer upload dos vídeos para a nuvem de empresas fruto do capitalismo que dizem desprezar. Objetivamente, nem se percebe onde quer chegar o líder da ONU com esta retórica, não sendo achar que fica bem na fotografia. Afinal, os líderes industriais e de Estado responsáveis bem sabem qual é a realidade - e são os primeiros a........

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