Na véspera das eleições escrevi aqui as considerações que deveriam orientar a escolha de um governo em função dos resultados eleitorais:

1 – A questão democrática

A democracia é o governo da maioria. E a maioria é 50% 1

Não é o governo da maior minoria.

As eleições não são um jogo para ver quem ganha e quem perde. São sim um método para encontrar um governo da maioria (com suporte de 50% 1 dos deputados)

A Democracia assenta também na dialética entre um Governo com suporte de mais 50% da AR e uma Oposição de mãos livres que tem, antes de mais, de representar o seu eleitorado e que não pode ser responsabilizada pelas políticas e orçamentos (elemento consagrante das escolhas políticas de quem governa) do Partido que Governa. A existência de um Governo Minoritário resulta da opção exclusiva de quem governa. Não pode assim pedir suporte a quem tem um ideário diferente e está na oposição.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Quando os eleitores não dão a maioria absoluta a um só partido a leitura a fazer é que querem um Governo de Coligação. Não dar uma maioria absoluta a um só partido significa que “chumbam” o propósito desse partido (ou conjunto de partidos), de \governar sozinho.

2 – O Realismo e a preocupação com o País

É absolutamente irrealista ignorar o estado em que os governos socialistas deixaram os serviços públicos. Todos os serviços públicos. Por, em 8 anos, não se ter investido nem se terem atualizado as condições salariais e de carreira das várias profissões ligadas ao Estado, situação esta agravada pela inflação e inúmeras aposentações

Pegar no País no estado em que ele está, a que acrescem os crescentes conflitos internacionais, sem ter o suporte de uma maioria na AR é loucura política e falta de preocupação com o País.

e na semana seguinte apliquei-as ao resultado saído das eleições

Escrevi:

Será possível a um governo destes fazer qualquer reforma? E será possível gerir o país sem reformas como o fez António Costa, o que levou ao estado em que estão TODOS os serviços públicos ao fim de anos sem investimento, com uma tremenda falta de pessoal e os profissionais que restam sobrecarregados e acusando o desgaste do poder de compra traduzido num crescendo reivindicativo, até à margem dos sindicatos tradicionais?

Será possível fazer reformas e tomar “medidas difíceis” que todos os dias serão atacadas, no parlamento e televisões, por seis partidos contra apenas um a defendê-las? Para além do “ataque na rua” promovido pelas centrais sindicais (sim, a UGT irá estar ao lado do PS e de PNS) e até pelos “espontâneos, “soprados pelo BE?

Será possível quando falta o único argumento válido e imprescindível “Estamos a cumprir o mandato que a maioria dos eleitores nos deu”?

Ao fim de apenas um mês de governo parece claro o acerto do escrito acima. Espanta-me que a maioria dos comentadores credenciados, como Paulo Portas e Marques Mendes, venham agora apontar à Cheringonça (termo divertido empregue por Paulo Portas referindo-se a uma coligação entre Chega, PS e demais partidos da esquerda que estaria a substituir-se ao Governo , governando através da Assembleia da República, mas sem a correspondente responsabilidade orçamental) em vez de focarem o erro base , constitucional e político, de termos um Governo apoiado em apenas 30% dos votos.

E é este erro base, resultado das linhas vermelhas, que precisa de ser ultrapassado.

João Marques de Almeida (e outros) tem toda a razão. Mais, os portugueses que nestas eleições disseram não ao socialismo e aos socialistas estão a ver defraudadas as suas expectativas de reformas e em risco de mais 8 anos de governos socialistas, com o argumento “a direita não se entende para governar”

Como então ultrapassar as linhas vermelhas?

1 – Em primeiro lugar perceber que todos os Governos minoritários tiverem mau resultado (exceto o de Cavaco Silva que aconteceu em situação muito peculiar e mesmo assim só durou 2 anos)

2 – Que derivam de um pacto constitucional tendo em vista o Partido Socialista governar sem estar dependente do PCP (o responsável pelo PREC que destruiu parte da nossa indústria e nos ia impondo uma ditadura comunista) caso a esquerda tivesse a maioria no parlamento e o PS fosse o partido mais votado. Assim na constituição não ficou a votação do governo nem do seu programa. Estas foram as primeiras linhas vermelhas a que se chamou ”arco da governação”. Assim Marcelo Rebelo de Sousa e Manuela Ferreira Leite viabilizaram governos socialistas minoritários aprovando a priori os orçamentos socialistas. Durão Barroso não e obrigou Guterres a recorrer ao deputado “limiano” do CDS. Passos Coelho ao princípio sim e no fim não. Pois já não era mais possível.

3 – Pedro Nuno Santos precisa de esclarecer se o Chega merece o mesmo tratamento que teve o PCP e nesse caso precisa de ser coerente e fazer o mesmo que fez Marcelo Rebelo de Sousa, e deixa o PSD governar como entender, ou senão, que esvazie o balão do “Perigo do Chega” que andou a insuflar, pois não pode alimentar esta tese e ao mesmo tempo pôr em prática a Cheringonça.

4 – Se o PS não vê problemas em governar na AR através de uma Cheringonça qual é razão para Luís Montenegro manter as linhas vermelhas e o não é não?

5 – E aquilo que muitos eleitores sentem, é que para o PSD as linhas vermelhas são apenas um pretexto para o PSD ficar com todo o Governo (e os cargos) só para si.

6 – O País precisa de reformas e estas para acontecerem precisam de estabilidade e de um Governo com autoridade, suportado na maioria do Parlamento (50% 1)

7 – Ninguém duvida que Luís Montenegro tem capacidade política para lidar com o Chega e integrá-lo. Partidos extremistas e populistas crescem e têm mais influência quando estão fora do que quando estão dentro da esfera governativa.

8 – As linhas vermelhas não constavam da moção de candidatura de Luís Montenegro à liderança do PSD nem nunca foram votadas em Congresso ou Conselho Nacional do PSD.

9 – Luís Montenegro precisa da humildade de reconhecer a realidade e aquilo que foram os resultados eleitorais, pôr o interesse do País acima de tudo, e deixar cair as linhas vermelhas. Ainda antes das eleições europeias seria melhor do que depois empurrado pelo resultado destas.

10 – O País agradece.

PS. Apostar na vitimização para colher dividendos em próximas eleições antecipadas será um tremendo erro: será mau para o País e à direita não lhe perdoarão ter desperdiçado uma ampla maioria que lhe permitia governar com estabilidade uma legislatura inteira e fazer reformas. À esquerda dirão. “A direita não se entende para governar e por isso não merece o voto que os portugueses lhe deram”. E, estando todo o capital político que resta, num PSD fechado, empenhado neste Governo, isto pode ser o fim, ao fim de 50 anos, de um PSD como partido de liderança de Governo.

Receba um alerta sempre que António Alvim publique um novo artigo.

QOSHE - As linhas vermelhas. Como as ultrapassar? - António Alvim
menu_open
Columnists Actual . Favourites . Archive
We use cookies to provide some features and experiences in QOSHE

More information  .  Close
Aa Aa Aa
- A +

As linhas vermelhas. Como as ultrapassar?

27 1
07.05.2024

Na véspera das eleições escrevi aqui as considerações que deveriam orientar a escolha de um governo em função dos resultados eleitorais:

1 – A questão democrática

A democracia é o governo da maioria. E a maioria é 50% 1

Não é o governo da maior minoria.

As eleições não são um jogo para ver quem ganha e quem perde. São sim um método para encontrar um governo da maioria (com suporte de 50% 1 dos deputados)

A Democracia assenta também na dialética entre um Governo com suporte de mais 50% da AR e uma Oposição de mãos livres que tem, antes de mais, de representar o seu eleitorado e que não pode ser responsabilizada pelas políticas e orçamentos (elemento consagrante das escolhas políticas de quem governa) do Partido que Governa. A existência de um Governo Minoritário resulta da opção exclusiva de quem governa. Não pode assim pedir suporte a quem tem um ideário diferente e está na oposição.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Quando os eleitores não dão a maioria absoluta a um só partido a leitura a fazer é que querem um Governo de Coligação. Não dar uma maioria absoluta a um só partido significa que “chumbam” o propósito desse partido (ou conjunto de partidos), de \governar sozinho.

2 – O Realismo e a preocupação com o País

É absolutamente irrealista ignorar o estado em que os governos socialistas deixaram os serviços públicos. Todos os serviços públicos. Por, em 8 anos, não se ter investido nem se terem atualizado as condições salariais e de carreira das várias profissões ligadas ao Estado, situação esta agravada pela inflação e inúmeras aposentações

Pegar no País no estado em que ele está, a que acrescem os crescentes conflitos........

© Observador


Get it on Google Play