Ouvimos muitas vezes dizer que o Natal já não é o que era. Concordo plenamente com esta frase.

Na época em que vivemos, o Natal é encarado, salvo honrosas exceções, como um período em que todas as pessoas têm como preocupação principal a compra das prendas para os familiares e/ou amigos.

Nos meus tempos de criança, o Rei do Natal era o Menino Jesus. Hoje foi substituído pelo pai natal. As prendas que antes eram deixadas no sapatinho que os nossos pais, ou nós próprios, colocávamos junto à lareira na esperança de que pela chaminé descesse o Menino e que depositasse as prendas que nós tanto esperávamos. Hoje são postas na árvore de Natal e é o chamado Pai Natal que se encarrega de as trazer. A noite de 24 para 25, chamada noite de consoada, parecia que nunca mais acabava. Pela manhã, bem cedo, íamos ver o que os nossos sapatos tinham para nós. Ano após ano lá estavam os bombons, quase sempre pequeninos e redondinhos, que nos deixavam muito contentes. Pensávamos, então, que o Menino Jesus nos recompensou por nos termos portado bem durante o ano. Havia sempre um sapato onde aparecia carvão. Que ingénua alegria era para nós vermos que não era o nosso.

Alargando a minha reflexão a outros períodos do ano, direi que houve uma transformação enorme em relação ao período atual. É claro que o desenvolvimento tecnológico arrastou muitas transformações em todos os domínio da sociedade. Quase desapareceram os carrinhos de madeira ou de lata, substituídos pelos carros elétricos com ou sem comando à distância.

Não pretendo fazer comparações valoradas. A transformação que aconteceu deve-se, em minha opinião, à deterioração do conceito daquilo que era a família e que se perdeu.
Como era o dia 24 na vida de uma família de sete filhos vivendo numa aldeia de Trás-os-Montes? Era muito simples como em quase todas.

Logo após tomarmos o pequeno almoço saíamos com as vacas para o lameiro. Nesse dia, ao contrário do que normalmente acontecia, não levávamos merenda, pois era dia de jejum. Por vezes, algum de nós se descuidava e comia qualquer coisa. Quando isso acontecia dizíamos que esse jejuava à “santa codinha”, ou seja, “furava” o jejum. Era um dia que durava mais do que os outros. Quando chegava a hora de tocar as vacas para casa, era sempre uma enorme alegria.

Para os mais novos era um dia de desassossego e de ansiedade à espera que chegasse a hora de cear que era pouco depois do pôr do sol. O polvo cozido com batatas, cebola cozida, tronchos e rábanos faziam parte da maioria da ceia das casas da nossa aldeia. Eu gostava muito das batatas cozidas na mesma panela que o polvo e que ficavam com a cor avermelhada deste. De sobremesa, haviam rabanadas feitas de pão cozido no forno da nossa casa. Hoje diríamos que eram caseiras. Naquele tempo eram apenas rabanadas. Havia sempre chá para as acompanhar.

Após a ceia, acompanhávamos os nossos pais à Missa do Galo. Eram sempre um momento relevante desse dia. Os mais crescidos tinham o direito de ficar a admirar a fogueira do galo, feita no largo em frente à igreja.

QOSHE - Reflexão sobre a época natalícia - Manuel R. Cordeiro
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Reflexão sobre a época natalícia

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11.01.2024

Ouvimos muitas vezes dizer que o Natal já não é o que era. Concordo plenamente com esta frase.

Na época em que vivemos, o Natal é encarado, salvo honrosas exceções, como um período em que todas as pessoas têm como preocupação principal a compra das prendas para os familiares e/ou amigos.

Nos meus tempos de criança, o Rei do Natal era o Menino Jesus. Hoje foi substituído pelo pai natal. As prendas que antes eram deixadas no sapatinho que os nossos pais, ou nós próprios, colocávamos junto à lareira na esperança de que pela chaminé descesse o Menino e que depositasse as prendas que nós tanto esperávamos. Hoje são postas na árvore de Natal e é o chamado Pai Natal que se encarrega de as trazer. A noite de 24 para 25, chamada noite de consoada,........

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