Tem sido amplamente divulgado que a lei de proteção dos denunciantes decorre da transposição de uma diretiva europeia, de grande importância e que se pode traduzir numa mais-valia para as empresas, ao permitir identificar, dentro da própria organização, o que precisa ser corrigido, melhorado ou alterado.
Ora, estamos cientes que podem ser denunciantes de infrações, nos termos do diploma, os trabalhadores, os prestadores de serviços, os voluntários e estagiários, os titulares de participações sociais e os que pertençam a órgãos de administração, gestão, fiscais ou de supervisão. Então, se estamos a falar de denúncias dos próprios funcionários ou pessoas relacionadas com a empresa e se o objetivo é permitir e incentivar que haja denúncias de situações irregulares, como é que isto pode acontecer se os denunciantes não forem protegidos?
Obviamente que, sobretudo nas estruturas mais pequenas, os trabalhadores, prestadores de serviços, estagiários e até os sócios e membros dos órgãos sociais vão sentir-se constrangidos ao fazê-lo se não existir proteção adequada.
Vejamos: a lei determina que o denunciante, que haja de boa-fé e convicto de estar a relatar situação real, goze das prerrogativas aí enunciadas. Antes de falarmos sobre elas, importa sublinhar estes dois requisitos: de boa-fé e convicto de estar a relatar situações verdadeiras. Isto quer dizer que, apesar da lei proteger o denunciante, este não pode usar de má-fé e mentira na denúncia, uma vez que se trata de situação que, em última instância, pode ser resolvida em sede disciplinar e criminal.
O denunciante tem sempre a possibilidade de apresentar denúncia anónima. No entanto, e mesmo que assim não aconteça, os seus dados serão, para a entidade denunciada, confidenciais.
Neste sentido, os denunciados estão proibidos de exercer quaisquer atos de retaliação para com os denunciantes. Entende-se por retaliação o ato ou omissão, mesmo que na forma tentada ou de ameaça, que, direta ou indiretamente, em contexto profissional e motivado por uma denúncia interna, externa ou divulgação pública, cause ou possa causar ao denunciante, de modo injustificado, danos patrimoniais ou não patrimoniais.
O normativo estabelece que situações que ocorram em relação ao denunciante no período de dois anos desde a data da denúncia constituem presunção de ato de retaliação. Vejamos em concreto: as questões relacionadas com alterações das condições de trabalho ou retribuição, não promoção do trabalhador ou incumprimento de deveres laborais; suspensão de contrato de trabalho; avaliação negativa de desempenho ou referência negativa para fins de emprego; não conversão de um contrato de trabalho a termo num contrato sem termo (quando o trabalhador tivesse expectativas legítimas nessa conversão); não renovação de um contrato de trabalho a termo; despedimento; aplicação de sanção disciplinar; resolução de contrato de fornecimento ou de prestação de serviços; entre outras. Esta presunção de ato de retaliação é afastável pela entidade denunciada.
A proteção dos denunciantes é também extensível, com as necessárias adaptações, à pessoa singular que auxilie o denunciante no procedimento de denúncia e cujo auxílio deva ser confidencial, incluindo representantes sindicais ou representantes dos trabalhadores; a terceiro que esteja ligado ao denunciante, designadamente colega de trabalho ou familiar, e possa ser alvo de retaliação num contexto profissional; e a pessoas coletivas ou entidades equiparadas que sejam detidas ou controladas pelo denunciante, para as quais o denunciante trabalhe ou com as quais esteja de alguma forma ligado num contexto profissional.
A entidade denunciada que viole este preceito incorre em contraordenação muito grave, cuja coima se situa entre os 1.000€ e os 25.000€ para pessoas singulares e entre os 10.000€ e os 250.0000€ para pessoas coletivas.
Importa, pois, que as entidades obrigadas, por um lado, divulguem junto daqueles que podem ser os denunciantes a existência do canal de denúncia, incentivando à sua utilização e, por outro, prestem formação neste âmbito, principalmente no que concerne à sua proteção.
Em caso de dúvida sobre este tema, já sabe: contacte um Solicitador perto de si.

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“O que é a proteção contra...”

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26.01.2024

Tem sido amplamente divulgado que a lei de proteção dos denunciantes decorre da transposição de uma diretiva europeia, de grande importância e que se pode traduzir numa mais-valia para as empresas, ao permitir identificar, dentro da própria organização, o que precisa ser corrigido, melhorado ou alterado.
Ora, estamos cientes que podem ser denunciantes de infrações, nos termos do diploma, os trabalhadores, os prestadores de serviços, os voluntários e estagiários, os titulares de participações sociais e os que pertençam a órgãos de administração, gestão, fiscais ou de supervisão. Então, se estamos a falar de denúncias dos próprios funcionários ou pessoas relacionadas com a empresa e se o objetivo é permitir e incentivar que haja denúncias de situações irregulares, como é que isto pode acontecer se os denunciantes não forem protegidos?
Obviamente que, sobretudo nas estruturas mais pequenas, os trabalhadores, prestadores de serviços, estagiários e até os sócios e membros dos órgãos sociais vão sentir-se constrangidos ao fazê-lo se não existir proteção adequada.
Vejamos: a lei determina que o denunciante,........

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