“Aprender com a experiência dos outros é menos penoso do que aprender com a própria”.
(José Saramago)

José Luís Carneiro, Pedro Nuno Santos e Daniel Adrião são os três socialistas que se preparam para disputar as eleições para a sucessão de António Costa na liderança do PS, partido que, é bom lembrar, ainda mantém uma maioria absoluta no Parlamento.
Nos últimos dias, a opinião pública tem sido bombardeada com constantes divulgações dos apoios que alegadamente cada um dos contendores recolhe, num estranho jogo que configura uma campanha de pressão para influenciar o voto neste ou naquele candidato. Ignoro se a estratégia resultará, mas, sob esse ponto de vista, julgo que não será despiciendo fazer uma analogia com o que por vezes acontece com as sondagens…
Ninguém tem dúvidas de que a escolha do próximo secretário-geral do PS passará por José Luís Carneiro ou por Pedro Nuno Santos. Tal decorre do facto de não ser difícil de prever que, nesta quarta tentativa de chegar à liderança do partido, Daniel Adrião, que lidera uma sensibilidade minoritária no PS desde 2016 e que se apresenta em nome da “descontinuidade”, não tem qualquer hipótese de lá chegar.
Em todo o caso, e para além do currículo político de cada um dos candidatos, pouco se sabe das grandes linhas de intervenção que cada um deles se propõe apresentar ao partido e ao país. É certo que tanto o ainda ministro da Administração Interna como o ex-ministro das Infraestruturas e da Habitação já sinalizaram, aquando da apresentação das respectivas candidaturas, o rumo que tencionam seguir. Contudo, os militantes aguardam com expectativa as moções de orientação política para poderem assumir conscientemente a sua opção de voto. E, naturalmente, dispensam os ataques recíprocos já ensaiados este fim-de-semana, tanto mais que os opositores políticos se encontram no exterior do PS, em formações partidárias distintas.
Para já, o que não escapa a uma breve análise do que foi dito pelos dois é a certeza de existir uma visão quase antagónica, não tanto no plano político, mas principalmente no posicionamento do partido, em relação a futuros acordos parlamentares. Enquanto José Luís Carneiro admite não inviabilizar um governo minoritário do PSD, para evitar que a extrema-direita chegue ao poder, Pedro Nuno Santos não coloca de parte a reedição da chamada “geringonça”.
O mais tardar no final deste mês, data-limite para a apresentação das candidaturas e respectivas moções de orientação política, serão conhecidas as propostas que os socialistas irão sufragar. E será porventura a partir da leitura desses documentos que os militantes do PS escolherão, em meados de Dezembro, quem será o socialista que sucederá a António Costa como líder do partido. Obviamente, será também o candidato a Primeiro-ministro após as eleições legislativas de 10 de Março.
Importará, a propósito, dizer claramente que a antecipação do acto eleitoral do próximo ano decorre apenas do arbítrio de Marcelo Rebelo de Sousa, já que, no plano constitucional, não existe qualquer preceito que obrigue o Presidente da República a dissolver o Parlamento. Bem pelo contrário, subsiste na Assembleia da República uma maioria política estável que estaria disponível para indigitar um nome para formar um novo governo.
Não foi esse o entendimento do Chefe de Estado, que preferiu enveredar por um caminho que despreza as vantagens da estabilidade para o país, no momento internacionalmente sensível que atravessamos, caminho esse que não dá quaisquer garantias de governabilidade.
A opção presidencial, que – julgo - Maquiavel não enjeitaria, poderá ser interessante para o comentador, mas é péssima para Marcelo Rebelo de Sousa. Por um lado, porque é bastante perigosa para o regime democrático, por outro, porque poderá conduzir o país a um cansativo e custoso ciclo de actos eleitorais.
A espuma dos dias que, entretanto, nos inundou, com todo o tipo de informações, umas verdadeiras, outras nem tanto, não nos pode fazer esquecer que tudo terá principiado com o pedido de demissão apresentado pelo Primeiro Ministro. A demissão de António Costa surgiu, naturalmente, na sequência das suspeitas, levantadas pela Procuradoria-Geral da Repú- blica, de eventual interferência nos processos relativos à exploração de lítio e hidrogénio no nosso país.
Sem colocar minimamente em causa as diligências do ou dos inquéritos dos processos penais, não deixará, porventura, de ser curioso assinalar que a evocação do nome do Primeiro Ministro deu direito a um inquérito, enquanto a utilização do nome do Presidente da República e de familiares próximos, no caso das gémeas luso-brasileiras que beneficiaram de um tratamento de 4 milhões de euros no SNS, aparentemente não terá merecido qualquer atenção.
Conheço perfeitamente a asserção que garante ser a justiça igual para todos. Contudo, em alguns momentos, a realidade parece querer desmentir aquilo que a lei estabelece. Esperemos que se trate de mais um daqueles equívocos em que a vida é fértil.

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“Equívocos e realidades”

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21.11.2023

“Aprender com a experiência dos outros é menos penoso do que aprender com a própria”.
(José Saramago)

José Luís Carneiro, Pedro Nuno Santos e Daniel Adrião são os três socialistas que se preparam para disputar as eleições para a sucessão de António Costa na liderança do PS, partido que, é bom lembrar, ainda mantém uma maioria absoluta no Parlamento.
Nos últimos dias, a opinião pública tem sido bombardeada com constantes divulgações dos apoios que alegadamente cada um dos contendores recolhe, num estranho jogo que configura uma campanha de pressão para influenciar o voto neste ou naquele candidato. Ignoro se a estratégia resultará, mas, sob esse ponto de vista, julgo que não será despiciendo fazer uma analogia com o que por vezes acontece com as sondagens…
Ninguém tem dúvidas de que a escolha do próximo secretário-geral do PS passará por José Luís Carneiro ou por Pedro Nuno Santos. Tal decorre do facto de não ser difícil de prever que, nesta quarta tentativa de chegar à liderança do partido, Daniel Adrião, que lidera uma sensibilidade minoritária no PS desde 2016 e que se apresenta em nome da “descontinuidade”, não tem qualquer hipótese de lá chegar.
Em todo o caso, e para além do currículo político de cada um dos candidatos, pouco se sabe das grandes linhas de intervenção que........

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