Tal como sugerido a Pompeia, a mulher que se divorciou de Júlio César na Roma antiga, muitas vezes não chega ser, tem de se parecer. E vem isto a respeito dos robôs mais atuais que, para lá da sua capacidade de realizar trabalho de forma eficiente, têm vindo a ficar cada vez mais parecidos, estética e fisicamente, com os humanos.
São vários os exemplos que existem um pouco por todo o mundo, mas a questão mereceu mais discussão porque a Amazon, uma das maiores empresas do mundo na área tecnológica com foco nas vendas online e distribuição, iniciou uma série de testes com um robô – o Digit – colocando-o a trabalhar entre os restantes trabalhadores nos vários armazéns desta empresa nos Estados Unidos.
O Digit, desenvolvido pela Agility robotics, é um robô humanoide de duas pernas que pode andar, levantar caixas e que representa para as empresas um custo de “mão-de-obra” na ordem dos 10 a 12 dólares por hora, o que representará um valor de menos de metade do valor médio pago a um trabalhador humano pela empresa para as mesmas tarefas.

A pergunta que se coloca é se será mesmo necessário que o robô se pareça com um humano ou se pode ser apenas uma máquina desenhada para executar de forma eficiente uma, ou mais, tarefas. As opiniões dividem-se e alguns cientistas envolvidos no desenvolvimento da robótica partilham a ideia de que, apesar dos robôs humanoides terem grande potencial para colmatarem a lacuna tecnológica e serem cruciais no campo da robótica em geral, a forma humana nem sempre é a ideal para trabalhos específicos, como a movimentação de caixotes. Conseguindo mover caixotes com relativa facilidade, os humanos podem não apresentar o “formato” ideal para desenvolver tal tarefa. Aliás, há vários exemplos de robôs, como o Stretch, da conhecida empresa Boston Dynamics, que é um robô não humanoide com um braço tipo guindaste e que se move sobre rodas, que movimenta caixas de forma mais eficiente e eficaz do que qualquer trabalhador humano.

Por outro lado, um dos argumentos usados para a humanização dos robôs tem a ver com a capacidade de estes conseguirem adaptar-se à infraestrutura dos armazéns existentes e que não foram necessariamente desenhados para uso de robôs e automação. Além disso, esta opção confere também aos robôs a versatilidade que encontramos nos humanos para, por exemplo, poder levantar objetos de vários tamanhos e pesos. A forma humanoide dos robôs também permite que estes trabalhem em espaços construídos para pessoas e ao lado de pessoas. Além disso, permite ainda que os trabalhadores possam considerar o robô como um colega, atribuindo-lhe atributos habitualmente reservados para algo vivo, como ter uns “olhos sorridentes”. A mobilidade do formato de robôs bípedes verticais permite que se integrem perfeitamente na infraestrutura existente, não sendo necessário também que as empresas tenham de mudar a instalação física da empresa ou reforçar o fornecimento de energia da mesma.

As razões para uma conceção mais humana dos robôs prendem-se com múltiplos fatores, mas atribuir-lhes um ar familiar, e, com isto, conseguir maior aceitação na interação social com o robô é, sem dúvida, um fator central. Por outro lado, começa a ser cada vez mais relevante estabelecer uma comunicação eficaz e simples entre robôs e pessoas. A imitação de características humanas, como expressões faciais e gestos, pode melhorar bastante essa comunicação, tornando-a mais intuitiva e natural. Além disso, também se sabe que os seres humanos têm uma predisposição para responder emocionalmente a aparências humanoides, mesmo que estejam conscientes de que se trata de uma máquina.

Há, por isso, uma visão mais ambiciosa na construção de robôs que tornam cada vez mais parecidos fisicamente com os seres humanos. Apesar de os robôs atuais, como o Digit da Amazon, se centrarem em atividades industriais, como a movimentação de caixotes, muitas empresas planeiam explorar, no médio-prazo, o uso de robôs deste tipo para entrega de encomendas na casa das pessoas. À medida que se aproxima o cenário de haver veículos autónomos a poderem fazer entregas diretamente em casa, o desenho de um robô que faça a entrega em mãos começa a ser uma realidade.
Por isso, num futuro não muito longínquo, quando nos baterem à porta para entregarem uma encomenda, é provável que nos deparemos com os braços de um robô humanoide simpático e com uns “olhos sorridentes”, em vez de um simples amontoado de peças metálicas, circuitos eletrónicos, fios e baterias.

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“Ao Robô não chega ser, tem de...”

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19.02.2024

Tal como sugerido a Pompeia, a mulher que se divorciou de Júlio César na Roma antiga, muitas vezes não chega ser, tem de se parecer. E vem isto a respeito dos robôs mais atuais que, para lá da sua capacidade de realizar trabalho de forma eficiente, têm vindo a ficar cada vez mais parecidos, estética e fisicamente, com os humanos.
São vários os exemplos que existem um pouco por todo o mundo, mas a questão mereceu mais discussão porque a Amazon, uma das maiores empresas do mundo na área tecnológica com foco nas vendas online e distribuição, iniciou uma série de testes com um robô – o Digit – colocando-o a trabalhar entre os restantes trabalhadores nos vários armazéns desta empresa nos Estados Unidos.
O Digit, desenvolvido pela Agility robotics, é um robô humanoide de duas pernas que pode andar, levantar caixas e que representa para as empresas um custo de “mão-de-obra” na ordem dos 10 a 12 dólares por hora, o que representará um valor de menos de metade do valor médio pago a um trabalhador humano pela empresa para as mesmas tarefas.

A pergunta que se coloca é se será mesmo necessário que o robô se pareça com um humano ou se pode ser apenas uma máquina desenhada para........

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