Como resultado das recentes eleições legislativas, o governo mudou de cor e, naturalmente, alteraram-se as (algumas) opções políticas. Pelo que tenho aqui dito durante estes últimos três anos, é óbvio que fico na expetativa de algo (muito) se vá alterar com este novo governo, na tentativa de salvar o nosso Serviço Nacional de Saúde (SNS). O novo governo e, em especial, a nova Ministra da Saúde, Dra. Ana Paula Martins, têm pela frente um grande, melhor diria gigantesco, desafio: Como antes repetidamente referi, “reinventar” o SNS. Esperemos que tenham coragem e força para o conseguir.
Todo o País está na expetativa, julgo que mesmo a oposição! Os sindicatos já se colocaram na linha da frente. “O SIM disponibiliza-se para reunir com urgência com a ministra, porque ninguém imagina um plano sem serem envolvidos os profissionais e os médicos são pessoas ponderadas, do lado da solução e do SNS”. A FNAM espera “que a negociação seja séria, de forma transparente, cumprindo com as regras básicas, sem manipulação e sem jogos de bastidores, ao contrário de Manuel Pizarro”. Como já anteriormente aqui escrevi, não sou propriamente partidário de uma política de “democracia” sem limites, em que ‘todos mandam e ninguém tem razão’, mas é óbvio que, nas circunstâncias, vão ter de conversar muito!
O governo tem um compromisso eleitoral para cumprir e definiu como objetivo principal, nos primeiros 60 dias, “combater a desigualdade de acesso à saúde – ao nível das consultas, ao nível das urgências e ao nível das cirurgias”. Este tem sido o principal problema dos últimos tempos, epitomado pelo encerramento ou limitação dos serviços e tendo como resultado o aumento das listas de espera, em número e em tempo. Por falta de profissionais, especialmente médicos, dizem; por deficiente gestão, digo eu. É possível fazer muito melhor com o que temos, como aqui referi nas minhas Opiniões de maio e junho de 2021, chamando-lhe “o cancro do SNS”.
A segunda prioridade do programa eleitoral refere-se à necessidade de “motivar os profissionais de saúde”, especialmente os médicos e os enfermeiros. E é óbvio que o principal método de os motivar é o ajustamento salarial. Talvez não devesse ser, mas é; esta é a realidade. Há um mês, discuti aqui o assunto “salários dos médicos”. Suponho que os mesmos princípios se apliquem aos salários dos enfermeiros e de outros técnicos de saúde.
Em terceiro lugar, indica-se o “promover a saúde e a prevenção da doença”. Também já aqui discuti o assunto (março de 2021 ), relevando não apenas o papel dos profissionais de saúde, mas também o importantíssimo dever dos cidadãos na promoção da sua saúde e na prevenção da doença, sobretudo através da alteração de estilos de vida, que tantas vezes lhes é recomendado mas poucas vezes entendido.
Uma quarta prioridade referida no programa é “alargar cuidados de proximidade”. Esta era também a intenção do anterior governo ao criar as Unidades Locais de Saúde (ULS), estendendo-as a todo o País e incluindo todos os serviços de saúde. Em outubro do ano passado esse foi o tema desta minha coluna de Opinião. E discuti as fragilidades que esta medida, apelidada pelos governantes de então como “a grande reforma do SNS”, demonstrava em minha opinião. Recordo que a discordância com a extensão desta medida aos cinco grandes hospitais escolares do País foi a razão apresentada pela nova Ministra para se demitir, no final do ano passado, do cargo de presidente do conselho de administração do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte (Santa Maria), onde permaneceu menos de um ano. E o novo primeiro-ministro também já prometeu revê-la. Finalmente, foi-nos prometida a implementação de um “novo modelo de gestão hospitalar”. Não sei exatamente a que novo modelo se referem, mas o “deficiente modelo de gestão” foi o pecado que mais (muito) frequentemente aqui atribuí ao SNS. Não tenho qualquer dúvida de que este é o seu principal problema e a raiz de todos os problemas. É a deficiente gestão que está na origem de “Ineficiência e Desperdício”, subtítulo do livro “A Doença da Saúde”, que publiquei no início de 2001. Finalmente, quase duas décadas e meia depois, alguém se apercebeu que o atual modelo não serve o Serviço, nem os cidadãos. Não presta! Oxalá este governo consiga encontrar um que, finalmente, devolva ao SNS o papel que a Constituição de 1979 lhe estabeleceu de garantir ao cidadão “a proteção da saúde como um dever, mas, sobretudo, como um direito de todos, realizado através de um serviço nacional de saúde (SNS) universal e geral”. E, eu acrescentaria, de qualidade.
Como fiz questão de notar, estas eram medidas pelas quais eu, e certamente a maior parte de vós, tanto ansiávamos. Esta é uma nova oportunidade. Não a desperdicemos!
PS: Há duas semanas, neste mesmo local, o meu colega, Dr. Raul Garcia, escreveu a sua Opinião, com título idêntico. Estamos de acordo em quase tudo. Ainda assim, resolvi avançar com este escrito que já tinha preparado há algum tempo. Nunca somos demais!

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SNS – Uma nova oportunidade

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24.04.2024

Como resultado das recentes eleições legislativas, o governo mudou de cor e, naturalmente, alteraram-se as (algumas) opções políticas. Pelo que tenho aqui dito durante estes últimos três anos, é óbvio que fico na expetativa de algo (muito) se vá alterar com este novo governo, na tentativa de salvar o nosso Serviço Nacional de Saúde (SNS). O novo governo e, em especial, a nova Ministra da Saúde, Dra. Ana Paula Martins, têm pela frente um grande, melhor diria gigantesco, desafio: Como antes repetidamente referi, “reinventar” o SNS. Esperemos que tenham coragem e força para o conseguir.
Todo o País está na expetativa, julgo que mesmo a oposição! Os sindicatos já se colocaram na linha da frente. “O SIM disponibiliza-se para reunir com urgência com a ministra, porque ninguém imagina um plano sem serem envolvidos os profissionais e os médicos são pessoas ponderadas, do lado da solução e do SNS”. A FNAM espera “que a negociação seja séria, de forma transparente, cumprindo com as regras básicas, sem manipulação e sem jogos de bastidores, ao contrário de Manuel Pizarro”. Como já anteriormente aqui escrevi, não sou propriamente partidário de uma política de “democracia” sem limites, em que ‘todos mandam e ninguém tem razão’,........

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