Os socialistas elegeram este fim de semana um novo secretário-geral, mas o peso político do anterior, que se mantém primeiro-ministro, e o resultado aquém do esperado não permitiram ao PS andar com a vida para a frente, seguindo a máxima "rei morto, rei posto". É certo que ninguém esperava que Pedro Nuno Santos (PNS) aparecesse no Palácio dos Marqueses da Praia e Monforte com vontade e, sobretudo, capacidade para fazer esquecer, da noite para o dia, a liderança de António Costa. Mas também ninguém esperava que o novo secretário-geral aparecesse tão radicalmente moderado, enfiando o socialismo na gaveta e proclamando que o Orçamento para 2024, o tal que troca mais apoios sociais e recuperação do tempo de contagem congelado nas carreiras da Função Pública por um superávite, "é um bom Orçamento, que deve ser executado e cumprido".

Quem se afirma de convicções deve saber que elas só sobrevivem num ecossistema em que tudo depende da coerência. Se há coisa que os eleitores topam à distância é a confusão entre a convicção e a conveniência, bem traduzida no gozo com que Groucho Marx afirmou um dia: "Estes são os meus princípios. Se não gostarem, tenho outros."

Até se pode aceitar que o pragmatismo se imponha e que a materialização das "crenças ou dos factos de que apenas se tem provas morais" (convicção, in Dicionário Priberam) tenha de ser antecedida pela conquista do poder, mas isso não dispensa quem se quer afirmar líder de assumir por inteiro a conveniência do caminho escolhido. É, aliás, bastante curioso que tenha sido um dirigente da ala mais moderada, Eurico Brilhante Dias, a chamar a atenção para o facto de a unidade de um partido não poder ser feita apenas com pessoas (lugares), exigindo uma unidade programática onde as diferentes correntes se possam rever. Não significa que a estratégia esteja correta, mas parece que foi levada à letra, e isso, pelo menos, ajuda a explicar o tom evangélico que o vencedor usou num discurso que, procurando cativar o interesse de todos, parecia uma nota de boas-vindas de um albergue espanhol. Há sempre o risco de hipotecar a confiança dos que acreditaram no caminho que PNS foi trilhando, porque uma coisa é não renegar o passado coletivo recente, evitando fazer o que fizeram no PSD os não passistas (Rui Rio) e os passistas (Luís Montenegro), outra bem diferente é renegar o seu próprio passado.

Em teoria, uma das grandes vantagens socialistas na opção PNS seria a capacidade de afirmar rapidamente um projeto mobilizador, assente numa verdadeira alternativa face ao partido adversário, mas também em relação ao que o PS vinha fazendo. Se abdica dessa vantagem para se concentrar na disputa pelos votos do centro, onde o que conta é dizer tudo e o seu contrário, vai perdendo a capacidade de pescar votos úteis à esquerda. E se o PS não for visto como a mudança de que o país precisa, o novo secretário-geral arrisca vir a ser "apenas" líder da oposição. Sobre isso não restam grandes dúvidas, o melhor socialista para liderar a oposição é mesmo Pedro Nuno Santos. Se quiser mesmo vir a ser primeiro-ministro, então vai ter de começar por encontrar-se rapidamente consigo próprio.

Jornalista

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PS continua à procura do novo líder

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18.12.2023

Os socialistas elegeram este fim de semana um novo secretário-geral, mas o peso político do anterior, que se mantém primeiro-ministro, e o resultado aquém do esperado não permitiram ao PS andar com a vida para a frente, seguindo a máxima "rei morto, rei posto". É certo que ninguém esperava que Pedro Nuno Santos (PNS) aparecesse no Palácio dos Marqueses da Praia e Monforte com vontade e, sobretudo, capacidade para fazer esquecer, da noite para o dia, a liderança de António Costa. Mas também ninguém esperava que o novo secretário-geral aparecesse tão radicalmente moderado, enfiando o socialismo na gaveta e proclamando que o Orçamento para 2024, o tal que troca mais apoios sociais e recuperação do tempo de contagem congelado nas carreiras da Função Pública por um superávite, "é um bom........

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