Desde que a ideia surgiu, mas em especial a prática, que sou contra os “semestres” na Educação Básica e Secundária. Seja na versão de divisão do ano letivo, seja na versão de fatiar as disciplinas por semestres.

No primeiro caso, porque a divisão é algo artificial, pois faz tábua rasa das tradicionais pausas do Natal e Páscoa, mesmo para alguém que, como eu, não é propriamente um crente religioso.

E porque se revela falso o argumento da redução dos momentos de avaliação, dos três períodos para os dois semestres, porque em cada semestre acaba por ser obrigatória a realização de reuniões intercalares. O que transforma três reuniões obrigatórias em quatro. Até porque, pela observação de muitas situações, o excesso burocrático deriva da forma como as escolas organizam o seu trabalho em cascata de grelhas de calendarização, planificação, registo, avaliação, monitorização e mais o que for possível conceber por certas mentes, e não dos momentos de formalização da avaliação dos alunos.

No segundo caso, porque há disciplinas que já têm poucas horas semanais na matriz curricular e que, desta forma, acabam por ficar longe dos alunos durante vários meses ou mesmo um ano. Basta que, por exemplo, História comece no primeiro semestre de um determinado ano, sucedendo-se a Geografia no segundo, e no ano seguinte se inverta a distribuição, ficando História para o segundo semestre.

Mesmo não sendo assim, o contacto da disciplina com os alunos é quebrado desde o início de Fevereiro até meados de Setembro, o que só com muita dificuldade se pode considerar favorável para a consolidação das aprendizagens dos alunos. E quem diz História, diz qualquer outra disciplina.

Alega-se que, deste modo, concentrando os tempos semanais, os docentes ficam com menos turmas de cada vez. Mas a verdade é que, no fim, ficam com os mesmos alunos, o mesmo número de aulas e o mesmo trabalho. Quase me apetece fazer uma variante da piada dos dois frangos, só que neste caso se devem acrescentar as batatas fritas. Em vez de se comer tudo durante uma hora de almoço, meia hora fica para o frango e meia hora para as batatas.

Mas esta digressão sobre a semestralidade educacional, vem a propósito do novo Governo da República que, pelas primícias parlamentares, se adivinha destinado a uma esperança de vida de um semestre ou pouco mais. Porque já se percebeu que, bloqueada a conversa com a direita radical, resta a possibilidade de avançar com medidas que não desagradem ao PS. O que, pelo que já foi anunciado por Pedro Nuno Santos, não deve acontecer com o Orçamento do Estado para 2025. Que deve ser entregue até dia 10 de outubro e votado nos 50 dias seguintes, ou seja, até final de novembro.

Tomando posse amanhã, dia 2 de abril, nada nos garante que ainda esteja em plenas funções no dia 2 de dezembro. O que significa que, com este horizonte temporal, é muito difícil governar sem ser à pressa e em sobressalto, de forma a tentar que, caindo na votação do Orçamento, consiga chegar a eventuais novas eleições ainda num qualquer estado de pouca desgraça.

No caso da Educação, com o ano letivo a entrar na reta final, há pouco tempo para o muito que deve ser feito, desde logo em relação a provas de aferição em suporte digital para as quais há escassas condições para serem realizadas com um mínimo de rigor e equidade.

Assim como é necessário fazer o lançamento do próximo ano letivo, sendo muito complicado tomar medidas que possam, de forma eficaz, ultrapassar os constrangimentos verificados nos últimos anos, nomeadamente ao nível da falta de docentes, porque os concursos que foram lançados não vão resolver a situação.
Quanto ao tempo de serviço a recuperar, parecendo haver um consenso político alargado e ampla folga orçamental, deverá ser o menor dos problemas em cima da mesa do novo ministro.

Ministro de que se conhece escassa reflexão sobre o setor, mas que terá a seu cargo um superministério. Que exigirá muita coordenação, mas também uma razoável autonomia dos secretários de Estado. E esse pode ser um problema sério para o próximo semestre político.

QOSHE - Semestres - Paulo Guinote
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Semestres

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01.04.2024

Desde que a ideia surgiu, mas em especial a prática, que sou contra os “semestres” na Educação Básica e Secundária. Seja na versão de divisão do ano letivo, seja na versão de fatiar as disciplinas por semestres.

No primeiro caso, porque a divisão é algo artificial, pois faz tábua rasa das tradicionais pausas do Natal e Páscoa, mesmo para alguém que, como eu, não é propriamente um crente religioso.

E porque se revela falso o argumento da redução dos momentos de avaliação, dos três períodos para os dois semestres, porque em cada semestre acaba por ser obrigatória a realização de reuniões intercalares. O que transforma três reuniões obrigatórias em quatro. Até porque, pela observação de muitas situações, o excesso burocrático deriva da forma como as escolas organizam o seu trabalho em cascata de grelhas de calendarização, planificação, registo, avaliação, monitorização e mais o que for possível conceber por certas mentes, e não dos momentos de formalização da avaliação dos........

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