Para muitos portugueses (e muitos europeus), uma das principais preocupações é a prestação que têm de pagar nos seus empréstimos, consequência do aumento das taxas de juro.

Esse aumento dos encargos é a principal consequência da política monetária do Banco Central Europeu, que desde julho de 2022 procedeu a 10 subidas na taxa de juro de referência. Christine Lagarde, atual presidente do BCE, tem sido irredutível na prossecução do objetivo da instituição, a estabilidade dos preços - isto é, restituir a inflação ao valor de 2%.

A inflação na Zona Euro chegou a ultrapassar os 10% e colocou muita pressão sobre os orçamentos familiares, aumentando o custo de vida. Mas a causa inicial da inflação não foi um excesso de procura, mas a guerra da Ucrânia e a consequente escalada dos preços da energia.

Entretanto, os custos da energia baixaram e também os restantes produtos viram os seus preços moderarem-se. As medidas do BCE e de outros bancos centrais contribuíram para arrefecer a tendência inflacionária.

Os últimos dados para a Zona Euro (2,4% em novembro) indicam a aproximação ao valor de referência, uma correção que ultrapassou as expectativas do próprio BCE. Além disso, vários Estados-membros já se encontram abaixo do patamar de 2%, incluindo Portugal (1.6%), havendo até quem esteja em território deflacionário.

Em simultâneo, acumulam-se as evidências de que a economia europeia está (e vai continuar) a abrandar. Nas suas previsões de outono, a Comissão Europeia reviu em baixa os números do crescimento económico para a UE em 2023 e 2024. Pior: há 10 (!) Estados-membros com recessão prevista para este ano, incluindo a Alemanha.

Na sua reunião de outubro, o BCE finalmente parou o aumento dos juros, com atraso face aos avisos que já surgiam antes do verão. As consequências da decisão tardia estão a ser sentidas na economia. Os custos de financiamento das empresas estão muito altos, o que retrai o seu investimento; as famílias gastam parte importante dos seus orçamentos a pagar prestações aos bancos (que estão a obter lucros e a pagar dividendos astronómicos, em grande parte entesourados), reduzindo o consumo que anima a economia.

É preciso travar este efeito de bola de neve antes que seja demasiado grande. Face a perspetivas tão pouco animadoras para a economia europeia, e a um novo e grave problema orçamental na Alemanha, que limita ainda mais a margem de ação da política orçamental, é importante que o BCE compreenda que a manutenção das taxas de juro no nível atual pode ter consequências devastadoras. Logo, importa que não se demore demasiado tempo a inverter a marcha. Há que evitar que a recessão alastre a toda a Europa. Os mercados antecipam movimentos das taxas de juro no início de 2024, os bancos centrais continuam a apontar para 2025. Pelo caminho, sofrem as pessoas e podem sofrer ainda mais.

Com isto, não se contesta a independência do Banco Central, mas exige-se que olhe para a economia e para a sociedade e não apenas para gráficos. Porque, por cada ponto percentual de desemprego que a recessão causar, é da vida de 2 milhões de europeus que se está a falar.

A presença de petróleo em Essequibo, na Guiana, reativou a vontade da Venezuela em anexar esta região. Maduro, cada vez mais impopular internamente, replica assim a fórmula tirana de desviar as atenções. O mundo e a América Latina não precisam de mais instabilidade política, de mais vidas a sofrer.


Eurodeputado

QOSHE - À atenção de Lagarde - Pedro Marques
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À atenção de Lagarde

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07.12.2023

Para muitos portugueses (e muitos europeus), uma das principais preocupações é a prestação que têm de pagar nos seus empréstimos, consequência do aumento das taxas de juro.

Esse aumento dos encargos é a principal consequência da política monetária do Banco Central Europeu, que desde julho de 2022 procedeu a 10 subidas na taxa de juro de referência. Christine Lagarde, atual presidente do BCE, tem sido irredutível na prossecução do objetivo da instituição, a estabilidade dos preços - isto é, restituir a inflação ao valor de 2%.

A inflação na Zona Euro chegou a ultrapassar os 10% e colocou muita pressão sobre os orçamentos familiares, aumentando o custo de vida. Mas a causa inicial da inflação não foi um excesso de procura, mas a guerra da Ucrânia e a consequente escalada dos preços da energia.

Entretanto, os custos da energia baixaram e........

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