Chegaram ao fim as legislativas de 2024. Pelas regras constitucionais, serão as únicas do ano, mas receio que não cheguemos ao final do ano sem estar já a antecipar a marcação de novas eleições.

A opção de dissolver a Assembleia da República onde o PS tinha uma maioria absoluta teria estas consequências, sabíamos todos muito bem. A fragilidade da liderança do PSD; o choque da população com a demissão de António Costa, às mãos de um comunicado da PGR; o desgaste da governação no período mais recente, devido à crise de custo de vida e dos preços da habitação, e aos erros próprios, tudo fazia adivinhar este resultado ou outro parecido.

Havia problemas, mas os resultados já alcançados - mais emprego, menos pobreza, contas em ordem - criou as condições para os resolver. Agora o país arrisca ser governado de modo instável por um PSD apostado na quimera de uma redução do IRC, que se destina sobretudo às grandes empresas, e demasiado preocupado com os jogos políticos de vitimização que lhe possam garantir a sobrevivência. Condições que fazem perigar o aproveitamento dos fundos europeus, a transformação da nossa economia e o reforço da coesão social.

Ingovernabilidade. Mas também, e muito pior, populismo. O populismo que nos entra pelo país todo como se de um maremoto se tratasse.

Mais do que a xenofobia dos seus dirigentes, foi o populismo, a capacidade de fomentar o ódio contra as elites governantes, e uma muito eficaz comunicação com os jovens e os mais angustiados da nossa sociedade, através das redes sociais, que terá empurrado esse partido da extrema-direita para resultados inéditos na nossa democracia.

Os autoritários, os que sentem insegurança num dos países mais seguros do mundo, os descontentes com a democracia de Abril, que os há, os que acham que tudo é corrupção e jeitinhos, os que acham que o país tem demasiada redistribuição. Os outros tantos que acham que há redistribuição a menos, que estão chateados com os preços das suas casas ou dos seus filhos. Os que são inundados todos os dias com as notícias sobre o Portugal que não pode, e não lhes chega uma réstia de informação sobre o Portugal desenvolvido que também somos, todos esses foram impelidos para o voto populista.

A nossa democracia está hoje mais doente. Dezenas de populistas procurarão agora fazer apodrecer a casa da democracia.

Sim, temos de os combater sem quartel. Ir à luta. Ouvir. Escutar os anseios dos tantos descontentes. Nas conversas de café e em família. Nas redes sociais. Nessas televisões onde temos de reclamar espaço para o Portugal que pode. Exigir que ao menos agora a imensa maioria de comentadores de direita que pululam nas televisões falem do Portugal que pode. Ir à luta na construção de propostas e políticas para um Portugal mais igual. Dar segurança aos portugueses quanto à qualidade da nossa democracia.

Reconstruir a coligação da democracia com os jovens que deviam ter repulsa dos negacionistas das alterações climáticas. Reconstruir a coligação com os trabalhadores que os grandes financiadores da extrema-direita desprezam.

E exigir dessa direita que estava obcecada em chegar ao poder que não tenha contemplações com a extrema-direita. Sim, não nos venham agora com desculpas... A nossa democracia não está para brincadeiras.

É necessário assinalar a expressiva redução da abstenção. Independentemente da escolha partidária de cada um, é sempre positivo trazer os abstencionistas para o campo da participação eleitoral.

QOSHE - Ingovernabilidade e populismo - Pedro Marques
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Ingovernabilidade e populismo

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14.03.2024

Chegaram ao fim as legislativas de 2024. Pelas regras constitucionais, serão as únicas do ano, mas receio que não cheguemos ao final do ano sem estar já a antecipar a marcação de novas eleições.

A opção de dissolver a Assembleia da República onde o PS tinha uma maioria absoluta teria estas consequências, sabíamos todos muito bem. A fragilidade da liderança do PSD; o choque da população com a demissão de António Costa, às mãos de um comunicado da PGR; o desgaste da governação no período mais recente, devido à crise de custo de vida e dos preços da habitação, e aos erros próprios, tudo fazia adivinhar este resultado ou outro parecido.

Havia problemas, mas os resultados já alcançados - mais emprego, menos pobreza, contas em ordem - criou as condições para os resolver. Agora o país arrisca ser governado de modo instável por um PSD apostado na quimera de........

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