Quando penso em democracia, vejo a Basílica da Sagrada Família, em Barcelona, a obra-mestra de Antoni Gaudí (1852-1926), o genial arquiteto catalão. Ambas são monumentais, incorporando inspirações de diversas origens, mas inacabadas, em construção permanente. Também vejo, paradoxalmente, políticos como Donald Trump ou Viktor Orban. Gente que me lembra que a democracia, mesmo nos países mais avançados, é um sistema de governação frágil, que pode ser pervertido por ditadores vestidos com pele de cordeiro, por demagogos ou por loucos egocêntricos, que até podem chegar ao poder através do voto, mas depois o transformam em autocracias populistas.

Perante isto, só posso concluir que a democracia é um edifício belo, mas incompleto, que exige a contribuição do maior número de cidadãos para a sua consolidação e também de instituições eficazes, com capacidade para garantir o indispensável equilíbrio de poderes.

Aos cidadãos pede-se respeito pelas diferentes opiniões razoáveis, discernimento e coragem para combater os simplismos que são as bandeiras fáceis dos radicais de todas as cores. Pede-se igualmente que compreendam que um país, no nosso caso, Portugal, só progride se houver o maior grau possível de harmonia social e um leque de oportunidades que permita a cada um aspirar por uma vida digna. Esta é uma das lentes que os líderes e os representantes eleitos devem utilizar quando olham para a nossa sociedade e falam do nosso futuro.

É igualmente uma visão que os media devem ajudar a comunicar. Uma visão objetiva, diversificada, positiva, mas também crítica, sempre que se justifique. As plataformas sociais possibilitam que uma boa parte das conversas de taberna se transformem em perigosas falsidades globais, facilmente aceites por muitos e habilmente aproveitadas pelas fábricas de mentiras e os especialistas da demagogia. Essa transformação subverte a democracia. É uma ameaça crescente quer em Portugal, quer no espaço geopolítico em que nos enquadramos. Por isso, uma imprensa responsável é fundamental para a defesa da democracia. A Inteligência Artificial também deve ser utilizada no mesmo sentido.

Às instituições pede-se que funcionem de modo honesto e célere.

Honesto quer dizer que têm como fio condutor a procura do bem comum, a representatividade dos diferentes segmentos sociais, a segurança dos cidadãos, a administração criteriosa da Justiça, a separação dos poderes. A Assembleia da República não pode ser uma correia de transmissão do Governo ou um palco sem sentido, os partidos não devem ser uma trupe de apoio aos caciques, a política tem de se abrir aos cidadãos. Não se deve comportar como uma cidadela de acesso restrito, só reservado aos comparsas.

Célere quer dizer isso mesmo. Tem de haver rapidez na abordagem dos problemas que a todos afligem, na resolução dos conflitos e um tratamento com dignidade no relacionamento com as pessoas e as empresas. Isto inclui uma simplificação dos processos administrativos, a eliminação da burocracia que só serve para justificar o emprego de uma clientela política ou para disfarçar a ineficiência do sistema económico, que não progride e não cria possibilidades de trabalho ao ritmo que seria capaz de o fazer, se vivêssemos num ecossistema administrativo sem complexidades absurdas e regulamentações excessivas.

A democracia fica mais sólida e mais criadora quando se acredita nos cidadãos, quando a confiança existe de modo generalizado. Por outro lado, numa cena internacional em crise crescente, o fortalecimento da nossa democracia requer um reforço inteligente e íntegro da nossa cooperação com os nossos vizinhos e aliados. A defesa da democracia é uma preocupação partilhada, que só pode terminar em vitória.

QOSHE - A vitória da democracia - Victor Ângelo
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A vitória da democracia

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25.04.2024

Quando penso em democracia, vejo a Basílica da Sagrada Família, em Barcelona, a obra-mestra de Antoni Gaudí (1852-1926), o genial arquiteto catalão. Ambas são monumentais, incorporando inspirações de diversas origens, mas inacabadas, em construção permanente. Também vejo, paradoxalmente, políticos como Donald Trump ou Viktor Orban. Gente que me lembra que a democracia, mesmo nos países mais avançados, é um sistema de governação frágil, que pode ser pervertido por ditadores vestidos com pele de cordeiro, por demagogos ou por loucos egocêntricos, que até podem chegar ao poder através do voto, mas depois o transformam em autocracias populistas.

Perante isto, só posso concluir que a democracia é um edifício belo, mas incompleto, que exige a contribuição do maior número de cidadãos para a sua consolidação e também de instituições eficazes, com capacidade para garantir o indispensável equilíbrio de........

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