“Se existe tanta crise é porque deve ser um bom negócio – Jô Soares”

Vivemos uma crise financeira e económica global sem precedentes. O turismo não é excepção. Nunca é.

Nem os mais importantes gurus da economia mundial foram capazes de a prever e, muito menos, encontrar as soluções para a resolver e ultrapassar.

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A “Tempestade”, desta vez mais destruidora que nunca, deixou o barco a navegar à deriva, sem leme nem mastro, comandante e tripulação sem alento, orando aos santos da sua devoção, pedindo uma qualquer salvação milagrosa, eterna ou outra.

O paralelismo com crises anteriores só serve para ilustrar a dimensão da tragédia, uma vez que a crise actual, quer na essência e conteúdo, quer ao nível das implicações económicas mundiais, é substancialmente diferente e, por conseguinte, pouco ou nada comparável.

Não admira, portanto, que a actividade turística contemporânea enfrente o seu maior desafio de sempre, com especial incidência em destinos tradicionais, como o Algarve, por exemplo, tanto mais que o nosso principal fornecedor, o Reino Unido, se confronta, igualmente, com uma crise profunda e sem precedentes.

Caracterizada por investimentos de capital intensivo e rendibilidade a longo prazo, a actividade hoteleira e turística só agora começa a interiorizar a gravidade da crise em que se encontra mergulhada. Não, não é pessimismo. É realismo. O nosso turismo tem sofrido de uma anestesia permanente, demorando demasiado tempo a despertar da longa letargia e hibernação onde tem estado comodamente arrumado.

Desiludam-se todos aqueles que, por razões de profissão ou cargo político, estão obrigados a apressar anúncios de bons augúrios que, não haja dúvidas, tardarão muito a chegar.

Recusada e ignorada, assumida a medo, tardiamente e fora de horas, a crise tem encontrado as condições propícias para dar largas, em toda a plenitude, à sua capacidade criativa e impetuosidade devastadora.

Mais grave, quando finalmente se aceitou o inevitável, timidamente, diga-se, fez-se quase tudo mal e à pressa, em cima do joelho.

Em nome de outros interesses, conhecimentos inexistentes, maus aconselhamentos e outros, desperdiçaram-se meios, tempo e energias, sem contrapartidas visíveis, ao serviço de “arrogâncias” mal contidas e nada disfarçadas.

É preciso reinventar as competências e atribuições dos organismos responsáveis, cansados e esgotados na sua acção, capacidade criativa e promocional.

Problemas novos exigem soluções novas. Porém, e embora devidamente informados e avisados sobre o fenómeno, recuperaram-se receitas antigas, algo rebuscadas, ignorando as vozes discordantes, derramando dinheiro aos milhões em cima dos problemas, pasmando os mais crédulos e, por mais incrível que pareça, sem resultados aparentes.

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Por favor, não desmintam. Fica mal, é deselegante, e sabe a desculpa de mau pagador. Assumam e partam para outra. Precisamos ser, de uma vez por todas, capazes de aceitar os erros cometidos, ser humildes na acção e simples na colaboração e cooperação. Mais que o interesse do turismo está em causa o interesse geral e colectivo.

Para contornar esta situação, persiste-se em optimismos invisíveis, ignoram-se os problemas, propagandeiam-se sucessos a partir de insucessos. Confunde-se a árvore com a floresta.

O discurso do melhor ano turístico de sempre, induz em erro agentes do sector e consumidores. Os primeiros, perante perspectivas tão animadoras, aumentam preços, enquanto os segundos, confrontados com preços mais altos e capacidades esgotadas, optam por outros destinos. Os resultados turísticos nacio9nais não se reflectem de igual modo nas empresas, na medida em que não levam em consideração vários factores, nomeadamente o aumento das ofertas.

Este discurso conduz, inevitavelmente, a uma diminuição da procura, enquanto a oferta concorrente agradece e regista aumentos superiores a dois dígitos.

Os dirigentes políticos e privados do sector não têm estratégias de comunicação coerentes, não sabem que os media constituem, na actualidade, um importante factor de produção empresarial e, sobretudo, utilizam mal a disponibilidade dos media para promover os seus negócios colectivos e individuais.

Os custos, prejuízos e implicações negativas desta estratégia, profundamente errada, consubstanciados numa diminuição da procura aí estão para confirmar estes princípios. Ofertas promocionais de última hora em plena época alta não só não resolvem o problema como sabem a desculpas de mau pagador.

O que não pode continuar a acontecer é anunciar num dia o melhor ano turístico de sempre e, no seguinte, reivindicar apoios estatais e a redução dos impostos para viabilizar as empresas.

Os resultados empresariais não podem continuar a ser medidos apenas pelas taxas de ocupação e receitas, mas antes pelos lucros obtidos, caso contrário não bate a bota com a perdigota.

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Os problemas só se resolvem se forem assumidos, diagnosticados e tratados convenientemente. Ignorá-los é o primeiro passo para agravar ainda mais a doença e, por essa via, a cura definitiva.

Por tudo isto, mais do que carpir mágoas, é tempo de arregaçar as mangas e trabalhar. Trabalhar muito, e bem. Reinventem a promoção interna e externa. Reinventem os organismos públicos do Estado com a tutela do turismo quer eles sejam centrais, locais ou regionais. Fechem o que tiver de fechar. Poupem o que pode e onde deve ser poupado. Gastem o que deve ser gasto e onde deve. Esqueçam rivalidades, políticas ou outras. Ponham os interesses do turismo acima de outros, por mais legítimos que estes sejam ou possam parecer e, muito principalmente, aprendam a comunicar nos media.

Por favor, façam isso. O Turismo e o Algarve agradecem.

Para ler o artigo anterior do autor, clique aqui.

* Empresário / Gestor Hoteleiro

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QOSHE - A Crise Existe - Elidérico Viegas
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A Crise Existe

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26.01.2024

“Se existe tanta crise é porque deve ser um bom negócio – Jô Soares”

Vivemos uma crise financeira e económica global sem precedentes. O turismo não é excepção. Nunca é.

Nem os mais importantes gurus da economia mundial foram capazes de a prever e, muito menos, encontrar as soluções para a resolver e ultrapassar.

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A “Tempestade”, desta vez mais destruidora que nunca, deixou o barco a navegar à deriva, sem leme nem mastro, comandante e tripulação sem alento, orando aos santos da sua devoção, pedindo uma qualquer salvação milagrosa, eterna ou outra.

O paralelismo com crises anteriores só serve para ilustrar a dimensão da tragédia, uma vez que a crise actual, quer na essência e conteúdo, quer ao nível das implicações económicas mundiais, é substancialmente diferente e, por conseguinte, pouco ou nada comparável.

Não admira, portanto, que a actividade turística contemporânea enfrente o seu maior desafio de sempre, com especial incidência em destinos tradicionais, como o Algarve, por exemplo, tanto mais que o nosso principal fornecedor, o Reino Unido, se confronta, igualmente, com uma crise profunda e sem precedentes.

Caracterizada por investimentos de capital intensivo e rendibilidade a longo prazo, a actividade hoteleira e turística só agora começa a interiorizar a gravidade da crise em que se encontra mergulhada. Não, não é pessimismo. É realismo. O nosso turismo tem sofrido de uma anestesia permanente, demorando........

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