Sempre que o país entra nesta espiral de debate sobre o que acontecerá daqui a seis meses, o que fará o PS, ou o Chega, ou qual será a estratégia da AD, recordo-me da surpresa do Miguel Poiares Maduro quando, vindo do Instituto de Florença e depois de muitos anos como Juiz Europeu, aterrou em Portugal para ser Ministro Adjunto de Passos Coelho e ao fim de umas semanas disse algo como “em Portugal discute-se demasiado a política e de menos as políticas”. Ou seja, debate-se demasiado a estratégia e pouco as soluções para a vida dos portugueses.

Desta vez não é apenas a comunicação social que alimenta este debate, são os próprios partidos que concorrem pela liderança política da agenda. Fica a sensação que a prioridade não é a solução dos problemas, admito que deixem essa preocupação para o Governo e para a coligação AD (PSD/CDS). É um bom reconhecimento, mas não ajuda.

Tudo começou com uma manobra de diversão do Bloco de Esquerda que reciclou o “tour de construção da Geringonça” e passou uma semana a fazer números de “bob o construtor” da esquerda. Todos sentiram a obrigação de participar, mas Pedro Nuno Santos rapidamente matou o assunto quando reconheceu o direito de Luís Montenegro a governar.

No meio de toda a barulheira do Chega, entre 10 pedidos para entrar no Governo, 5 mudanças de opinião para um acordo parlamentar e centenas de injúrias a Luís Montenegro e a AD, o Chega volta a revelar-se surpreendido por a AD responder positivamente ao repto de Pedro Nuno Santos. Nas casas de adultos as pessoas respondem aos pedidos com urbanidade. André Ventura bem tenta disfarçar mas, tal como ele sabe, nós também sabemos que a pior coisa que lhe podia acontecer era uma aliança com a AD pois rapidamente perderia a máscara e ficariam a nu todas as mentiras que tem dito.

Com o Livre mais apagado desde as eleições, foi o PS que tomou a iniciativa de propor ao Governo, já por duas vezes, um acordo para o Orçamento Retificativo. Pedro Nuno Santos não quer correr o risco de ficar fora da fotografia para a solução de vários problemas e por outro lado, também quer demonstrar que é responsável e que quer ajudar o país a encontrar estabilidade. Por outro lado, sabe também que se não for através de um Orçamento Retificativo só com medidas positivas e populares pode correr o risco de ser colocado perante o risco de ter de aprovar o primeiro orçamento do Governo da AD. Pedro Nuno Santos insistiu e colocou um prazo de 60 dias, mas o PS sabe bem que aquilo que não resolveram em 8 anos também não se resolverá neste curto espaço de tempo. O PS também sabe, mas não assume, que, com ou sem reduções de impostos, o clima económico para o próximo ano não é tão favorável. O PS também sabe, mas finge não ao saber, que tudo o que for reposto agora ou acrescentado às remunerações terá custos também nos anos seguintes onde não sabemos se há excedentes.

No meio de toda esta turbulência e tentativa recorrente de condicionar a estabilidade, Luís Montenegro tem mantido o foco e o sangue frio que se espera de um Primeiro-Ministro. É para isso que foi eleito e o mais votado pelos portugueses. Todas estas iniciativas dos partidos da oposição fazem parte do “jogo”, mas enquanto estes jogam compete ao Governo do PSD/CDS resolver os problemas. E é mesmo assim. Não é preciso ficarmos demasiado preocupados com esta turbulência da oposição.

Termino como uma história que lá mais à frente irei recordar. O último Primeiro Ministro de Israel a recuar nos colonatos e a desmanchar centenas de casas construídas em território palestiniano foi Ariel Sharon. Precisamente o PM de Israel com mais fama, e proveito, de ser duro, de ser belicista etc. Ou seja, os fracos líderes tentam fazer-se mais fortes, como faz o atual PM de Israel. Sharon tinha credibilidade suficiente junto do seu povo para recuar, e assim o fez. Tal como há medidas que só podem ser decididas por Governos de esquerda, há decisões políticas que só podem ser tomadas por líderes acima de qualquer suspeita de pactuarem com a direita ou com a esquerda. Se José Luís Carneiro fosse líder do PS, estaria desde o primeiro dia a ser condicionado por ser “muleta do PSD”. Pedro Nuno Santos é o único líder do PS que pode aprovar um OE proposto pelo PSD/CDS sem que a sua base de apoio o acuse de ser de direita.

QOSHE - Discutir mais os problemas e menos as táticas - Duarte Marques
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Discutir mais os problemas e menos as táticas

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09.04.2024

Sempre que o país entra nesta espiral de debate sobre o que acontecerá daqui a seis meses, o que fará o PS, ou o Chega, ou qual será a estratégia da AD, recordo-me da surpresa do Miguel Poiares Maduro quando, vindo do Instituto de Florença e depois de muitos anos como Juiz Europeu, aterrou em Portugal para ser Ministro Adjunto de Passos Coelho e ao fim de umas semanas disse algo como “em Portugal discute-se demasiado a política e de menos as políticas”. Ou seja, debate-se demasiado a estratégia e pouco as soluções para a vida dos portugueses.

Desta vez não é apenas a comunicação social que alimenta este debate, são os próprios partidos que concorrem pela liderança política da agenda. Fica a sensação que a prioridade não é a solução dos problemas, admito que deixem essa preocupação para o Governo e para a coligação AD (PSD/CDS). É um bom reconhecimento, mas não ajuda.

Tudo começou com uma manobra de diversão do Bloco de Esquerda que reciclou o “tour de construção da Geringonça” e passou uma semana a fazer números de “bob o construtor” da........

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