Na gíria das redacções televisivas chama-se vox populi àquelas reportagens de rua que se fazem para escutar, ao acaso, opiniões de passantes sobre assuntos de interesse público, quase sempre ligados à situação económica. Uma espécie de “teste da verdade” sobre o impacto das medidas económicas ou dos números da conjuntura sobre o chamado “dia a dia” das pessoas. É, obviamente, a forma mais distorcida e errada de apurar a verdade sobre o que quer que seja. E, no caso português, uma forma acrescida de aumentar a depressão colectiva, pois que, como bem sabemos, jamais um português interrogado sobre a sua vida respondeu que vai bem, obrigado. Eis o último exemplo que retive de uma “reportagem” destas, feita há dias: na sequência de uma informação do INE que reportava uma baixa da inflação pelo terceiro mês consecutivo, perguntava-se a clien­tes de um supermercado se a notavam nos preços. Todos respondiam que não, claro, mas um ia mais longe e garantia que, “enquanto os preços estão sempre a subir, as pensões e os salários mantêm-se na mesma” — após o que seguiu caminho, deixando a ecoar três informações falsas sem contestação do repórter de serviço. Pergunto-me qual é o sentido e o interesse jornalístico de usar e abusar deste tipo de auscultação popular, feito de forma leviana e aleatória, sobre assuntos onde o simples confronto do interlocutor com a verdade dos factos e dos números poderia contribuir para uma discussão séria, enquanto a sua ausência é pasto para todo o tipo de demagogias e resulta numa caricatura do jornalismo.

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A voz do povo

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06.01.2024

Na gíria das redacções televisivas chama-se vox populi àquelas reportagens de rua que se fazem para escutar, ao acaso, opiniões de passantes sobre assuntos de interesse público, quase sempre ligados à situação económica. Uma espécie de “teste da verdade” sobre o impacto das medidas económicas ou dos números da conjuntura sobre o chamado “dia a dia” das pessoas. É, obviamente, a forma mais distorcida e errada de apurar a verdade sobre o que quer que........

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