Há dias Daniel Oliveira respondeu no Expresso ao aviso de Carlos Moedas que, dias antes, presumiu a vontade popular: “aqueles que não derem essa estabilidade aos portugueses vão pagar muito caro. Porque os portugueses não querem ir novamente a eleições.” É com base nesta ideia que o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa tenta colocar o peso da estabilidade exclusivamente nas mãos da oposição.

Não é por não saber que é a quem governa que cabe a maior responsabilidade de garantir estabilidade que Carlos Moedas lança estas palavras. Na verdade, estas não são sequer sobre estabilidade, responsabilidade política ou clareza programática, são sim a partilha do seu exemplo de tática, apropriação de resultados e medo num brutal clima de conflito artificial. Esta é a famosa “nova forma de fazer política” que temos visto em Lisboa e que merece contraponto, por ser o perfeito exemplo dos riscos que o Partido Socialista corre se hesitar sequer em afirmar-se como oposição ao Partido Social Democrata.

É do PSD a responsabilidade de encontrar soluções para governar e do seu líder a de provar o que significa o seu amplificado “Não é não”. Sempre foi claro para o Partido Socialista a enorme confusão que reinava numa direita na qual o PSD não era alternativa credível. Esta foi uma das principais causas de crescimento do Chega e qualquer hesitação do PS levará a semelhante processo junto do seu eleitorado no futuro.

O maior risco do PS não é vir a pagar o preço de eventuais eleições antecipadas. Sem poderes de adivinhação, a mobilização do eleitorado na defesa dos princípios fundadores do partido e um projeto aspiracional que permita ganhar a confiança das gerações mais jovens são traços de uma liderança do partido que garante a limitação desse risco. O maior risco é deixar o Chega sozinho na oposição. Esse é o caminho para o desaparecimento dos partidos do centro e o PS não o pode aceitar seja qual for o resultado deste exercício.

O PS tem de afirmar uma identidade, uma cultura acima dos atores e da espuma dos dias, que dê previsibilidade ao eleitorado, que permita ao país saber quais são as suas prioridades e soluções. Este é o caminho de afirmação de uma alternativa sólida num quadro instável com muitas eleições e no qual a direita, por muito que diga o contrário, não hesitará em manter o poder até ao momento em que as sondagens lhe pareçam mais positivas.

O caminho da defesa dos trabalhadores e do combate à desigualdade, de garantia e avanço de direitos desde a igualdade salarial das mulheres à afirmação do direito à Habitação como resposta à maior crise do país. De uma verdadeira transição energética justa por um país mais verde. Um caminho europeu, sem subalternização a fantasias liberais, para a construção de um país mais rico, garantindo maior crescimento através da inovação e assim financiando maior equilíbrio na sua distribuição. Esta afirmação é o caminho do reforço estrutural da democracia, esta é a responsabilidade que o PS deve ao país.

Ser raptado pelo medo e pela ameaça do preço das eleições só nos leva ao difícil espaço que ocupamos hoje em Lisboa. Mesmo quem, como eu, não vê em Montenegro a enorme elasticidade necessária para, à semelhança de Moedas, governar a seu bel- prazer, proclamar o que estava em curso como seu e até culpar a oposição pela sua própria incapacidade de resolver os problemas da cidade, tem de reconhecer o perigo de ser surpreendido por mais um infinito exercício de vitimização.

O PS, tanto em Lisboa como na cena nacional, deve ser oposição de forma clara. Para ficar preso no labirinto do medo basta uma primeira hesitação. Nos momentos difíceis recordemos as palavras de Soares, foi para momentos quentes como estes que o nosso fundador as inscreveu na história.

QOSHE - Os perigos de não ser oposição - Pedro Costa
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Os perigos de não ser oposição

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20.03.2024

Há dias Daniel Oliveira respondeu no Expresso ao aviso de Carlos Moedas que, dias antes, presumiu a vontade popular: “aqueles que não derem essa estabilidade aos portugueses vão pagar muito caro. Porque os portugueses não querem ir novamente a eleições.” É com base nesta ideia que o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa tenta colocar o peso da estabilidade exclusivamente nas mãos da oposição.

Não é por não saber que é a quem governa que cabe a maior responsabilidade de garantir estabilidade que Carlos Moedas lança estas palavras. Na verdade, estas não são sequer sobre estabilidade, responsabilidade política ou clareza programática, são sim a partilha do seu exemplo de tática, apropriação de resultados e medo num brutal clima de conflito artificial. Esta é a famosa “nova forma de fazer política” que temos visto em Lisboa e que merece contraponto, por ser o perfeito exemplo dos riscos que o Partido Socialista corre se hesitar........

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