A cimeira do clima, a COP28, chegou ao seu último dia oficial sem acordo e com duras críticas ao projeto de pacto apresentado pelo seu presidente, o sultão Al Jaber. Como era de esperar, o texto foi rejeitado por várias nações que desejam que seja estabelecido um caminho claro para a eliminação dos combustíveis fósseis.

No texto apresentado pelo ministro da Indústria dos Emirados Árabes Unidos, abriu-se a porta à redução, mas não à eliminação, dos combustíveis fósseis. Além disso, ficaram abertas muitas outras portas que permitiriam que o carvão, o petróleo e o gás, principais responsáveis ?pelas alterações climáticas, continuassem a ser utilizados nas próximas décadas, sem um compromisso claro de os eliminar.

Era de esperar este final, principalmente quando se dorme com o inimigo. O sultão Al Jaber escandalizou os delegados da cimeira do clima quando declarou que não existem provas científicas de que o declínio progressivo dos combustíveis fósseis ajude a atingir o objetivo de não ultrapassar o aumento de 1,50C, estabelecido no Acordo de Paris. Com esta afirmação, Al Jaber não só negou o que a ciência já afirma categoricamente, mas também questionou as palavras do secretário-geral da ONU. Lembre-se que António Guterres abriu a cimeira com um aviso inequívoco: “Não podemos apagar um incêndio com uma mangueira de combustíveis fósseis”.

A gravidade destas declarações reside no facto de pôr em causa o enorme conhecimento científico que existe a este respeito e dar asas a correntes negacionistas. Algo especialmente grave num ano em que as emissões provenientes de combustíveis fósseis não pararam de crescer devido ao seu aumento em países como a Índia ou a China.

Além disso, as declarações de Al Jaber voltaram a lembrar a sua polémica nomeação como presidente da COP28, já de si controversa por ter sido realizada num dos principais países produtores de petróleo.

É evidente que para atingir os seus objetivos, a COP28 tem de ter a ajuda de quem mais polui, mas colocá-lo na posição de decidir quando e como, é suicídio. O papel estratégico que a presidência desempenha na facilitação de debates e na promoção de acordos teria tornado aconselhável contar com alguém cujos critérios fossem mais consistentes com o objetivo da cimeira.

QOSHE - Apagar o fogo com gasolina - António José Gouveia
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Apagar o fogo com gasolina

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13.12.2023

A cimeira do clima, a COP28, chegou ao seu último dia oficial sem acordo e com duras críticas ao projeto de pacto apresentado pelo seu presidente, o sultão Al Jaber. Como era de esperar, o texto foi rejeitado por várias nações que desejam que seja estabelecido um caminho claro para a eliminação dos combustíveis fósseis.

No texto apresentado pelo ministro da Indústria dos Emirados Árabes Unidos, abriu-se a porta à redução, mas não à eliminação, dos combustíveis fósseis. Além disso, ficaram abertas muitas outras portas que permitiriam que o carvão, o petróleo........

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