Temos assistido a uma alteração do modo de aplicação do princípio da separação dos poderes. Alguns começaram a falar da judicialização da política enquanto outros preferem falar da politização do poder judicial. A maior atenção do poder judicial face aos poderes executivo e legislativo é o resultado do amadurecimento da sociedade portuguesa. Existirá uma tentação do poder judicial de interferir com a agenda política? Ou será antes o tempo de todos assumirem as suas responsabilidades?

As eleições nos Açores vieram mostrar que está difícil obter maiorias de um só partido ou coligação e que só o populismo da extrema-direita parece ganhar. As manifestações evidenciam uma tentativa de alguns grupos organizados de ganharem vantagem perante um Governo de gestão, necessariamente, fraco. Esta equação permite avaliar o resultado de um conjunto de políticas desenvolvidas sempre preocupadas com o politicamente correto.

As lideranças políticas devem compreender que os exercícios de cargo de representatividade estão ou devem estar orientados para o interesse público em representação do povo que os elege. A elevada taxa de abstenção nos Açores vem confirmar que estamos divorciados do interesse em intervir na vida política. Seria importante que exista a vontade política de alterar a lei eleitoral no estrito respeito da Constituição. A lei eleitoral reflete uma realidade de divisão administrativa de Portugal que está extinta: o distrito. Este define o círculo eleitoral e permite que exista uma grande concentração no litoral, esquecendo o interior, cujos círculos refletem a sua existência de territórios de baixa densidade. A melhor forma para se ultrapassar esta situação seria criar círculos eleitorais mais reduzidos, mas que permitissem ao eleitor conhecer em quem se vai votar. Desta forma, poderia existir um incentivo ao eleitor e uma maior responsabilidade dos partidos na escolha dos candidatos. Outra medida legislativa teria a ver com o respeito da Constituição na observância do cumprimento dos prazos de detenção, que o caso da Madeira veio evidenciar de uma forma grosseira, em matéria de direitos, liberdades e garantias. Quando estamos a viver um ciclo eleitoral, o país não pode continuar à procura de um Messias salvador que venha trazer a felicidade e a abundância em troca da paz, da ordem e da autoridade.

A política não é algo que se venda no sentido de uma compra de votos. A política é uma arte que muitos estudam, mas poucos compreendem. Precisamos, pois, de encontrar a reflexão necessária que permita adotar políticas que sejam coerentes, integradas e globais respondendo aos reais anseios das pessoas.

Francisco Sá Carneiro disse um dia que a “política sem risco é uma chatice, mas sem ética é uma vergonha”. Esta frase encerra em si um programa na maneira de fazer política. De um lado, perceber que fazer política tem sempre um risco associado e para ser bem-sucedido implica saber ter intuição. Tem de se ter uma ética de responsabilidade, aquela que vai definir o momento de saber estar ou, de eventualmente, saber que se tem de sair. Hoje, este modo de fazer política é substituído pela cautela de segurar o lugar enquanto outros, pela ausência de ideias, procuram encontrar o erro que se comete sempre. Reside, nesta avaliação, a distinção do que Max Weber defendia entre ciência e técnica, ou seja, saber fazer política por vocação ou por profissão.

QOSHE - À procura do Messias - António Tavares
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À procura do Messias

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08.02.2024

Temos assistido a uma alteração do modo de aplicação do princípio da separação dos poderes. Alguns começaram a falar da judicialização da política enquanto outros preferem falar da politização do poder judicial. A maior atenção do poder judicial face aos poderes executivo e legislativo é o resultado do amadurecimento da sociedade portuguesa. Existirá uma tentação do poder judicial de interferir com a agenda política? Ou será antes o tempo de todos assumirem as suas responsabilidades?

As eleições nos Açores vieram mostrar que está difícil obter maiorias de um só partido ou coligação e que só o populismo da extrema-direita parece ganhar. As manifestações evidenciam uma tentativa de alguns grupos organizados de ganharem vantagem perante um Governo de gestão, necessariamente, fraco. Esta equação permite avaliar o resultado de um........

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