O dia nasceu um pouco cinzento e enublado, mas nem por isso logrou abater o entusiasmo e a alegria esfuziante dos milhares e milhares de pessoas que decidiram e foram para a Av. da Liberdade cantar a liberdade com que o 25 de Abril de 1974 nos brindou a todos/as. Eram novos/as, eram idosos/as, homens e mulheres, jovens e crianças entoando as canções e as palavras de ordem mais icónicas que marcaram a Revolução dos Cravos. Cravos que emolduravam cabeças, roupas e eram erguidos nas mãos dos/as protagonistas da festa. “Grândola, Vila Morena” foi cantada com um misto de enlevo, de amor e de entrega sem limites. Como diria, de novo, Chico Buarque, “Foi bonita a festa, pá...”… Nas redes sociais e nos média podiam ler-se os poemas mais belos e evocativos da Revolução da autoria de Sophia de Mello Breyner, Manuel Alegre, Ary dos Santos e outros/as com igual amor à liberdade. A voz única e ímpar de Adriano Correia de Oliveira evocava a resistência à noite escura da nossa história, que durou 48 anos. Grande parte das pessoas que percorria muito lentamente a avenida, a corrente humana era tão intensa que não era possível prosseguir o caminho num passo normal, não viveu a sujeição a um regime, que até na ditadura era medíocre e miserável; mas tinha conhecimento e consciência da privação dos mais elementares direitos fundamentais inerentes ao ser humano, humilhando-o e negando-lhe dignidade. Os universitários eram vistos como revoltosos, pelo que a PIDE/DGS visitava frequentemente as chamadas repúblicas, habitadas por estudantes, com o objectivo de apreender livros, documentos ou comunicados indiciadores de serem do “contra” e que servissem de motivo para a sua detenção sem prazos e sem mandado judiciário. Não eram admitidas manifestações, eram proibidas as greves, ajuntamentos, a imprensa, a poesia e a literatura eram objecto de censura prévia. E as prisões, pela calada da noite, sucediam-se, apenas porque alguém pensava diferente. A mulher era uma cidadã de segunda, que nascera para ser subserviente e dona de casa, dona de nada... Sim, as várias gerações que percorreram as ruas da liberdade no 50. aniversário do 25 de Abril sabem de todas aquelas iniquidades, sofridas por um povo agrilhoado a um regime serôdio e decrépito, sustentado por uma polícia politica. Sim, nenhum deles, nenhuma delas quer viver desse modo e, por isso que, de olhos apaixonados e sorriso nas faces entoavam bem alto “Fascismo, nunca mais!” e “O povo unido nunca mais será vencido”. E assim será o futuro, consolidado na paz, na fraternidade e na democracia, sempre em busca de uma sociedade mais justa e equitativa. Viva o 25 de Abril!

A autora escreve segundo a antiga ortografia

QOSHE - O cantar da liberdade - Cândida Almeida
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O cantar da liberdade

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28.04.2024

O dia nasceu um pouco cinzento e enublado, mas nem por isso logrou abater o entusiasmo e a alegria esfuziante dos milhares e milhares de pessoas que decidiram e foram para a Av. da Liberdade cantar a liberdade com que o 25 de Abril de 1974 nos brindou a todos/as. Eram novos/as, eram idosos/as, homens e mulheres, jovens e crianças entoando as canções e as palavras de ordem mais icónicas que marcaram a Revolução dos Cravos. Cravos que emolduravam cabeças, roupas e eram erguidos nas mãos dos/as protagonistas da festa. “Grândola, Vila Morena” foi cantada com um misto de enlevo, de amor e de entrega sem limites. Como diria, de novo, Chico Buarque, “Foi bonita a festa,........

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