Ao contrário do habitual, desta vez o primeiro-ministro indigitado conseguiu formar Governo longe do espaço público mediático. Até ao dia de ontem em que partilhou os nomes dos ministros com o presidente da República, não houve fugas de informação. Isso é bastante positivo. No entanto, o exercício de governação não deve seguir o mesmo distanciamento em relação aos média noticiosos. Este novo ciclo político impõe uma regular prestação de contas e a constituição de canais através dos quais circule uma informação relevante e rigorosa.

Não será fácil a governabilidade do país. Impossibilitado de governar apenas por decretos, o novo primeiro-ministro terá de se submeter a um Parlamento com bancadas impiedosas. Isso vai provocar um desgaste natural, porque essas forças de bloqueio serão ativas na propagação das reações. Luís Montenegro procurou blindar os ataques, colocando na liderança dos deputados do PSD Hugo Soares, um homem de sua confiança, hábil no diálogo com os partidos e acutilante nas respostas aos jornalistas. Não chega. Porque, à sua frente, terá sempre um conjunto de deputados ativos no papel de duros oponentes.

Neste contexto, Montenegro é obrigado a centrar-se na construção de uma opinião pública favorável a si. E isso não se faz (apenas) através das redes sociais. Este Governo precisa de uma estratégia de comunicação bem pensada e articulada, sobretudo com os jornalistas. É verdade que, até agora, o PSD beneficiou de um número significativo de comentadores com um posicionamento ideológico mais à Direita que foi desenvolvendo linhas de pensamento favoráveis a uma alternância do poder. Que está concretizada. E isso dificulta a continuidade desse tipo de comentário.

Nas próximas semanas, a acrescer a um Parlamento hostil e de partidos adversos, o Governo enfrentará a expectativa de classes profissionais demasiado numerosas: professores, médicos, polícias... Há muitas fontes de informação prontas a criar uma noticiabilidade de ângulos negativos. Será um erro crasso desvalorizar esta nova ambiência. E isso exige, desde já, uma estrutura de coordenação da informação de todos os ministérios que, a partir de S. Bento, vá articulando estratégias daquilo que (não) deve ser dito. Adicionalmente, cada ministério deve também contar com assessores experientes sobretudo em gerir situações de crises e em treinar governantes para a informação a prestar aos jornalistas. Também não deve ser desvalorizado aquilo que se difunde nas redes sociais, que há muito deveriam ter deixado de ser acervos de conteúdos criados para outros meios.

A partir da próxima semana, teremos um Governo em funções. Sem estado de graça. Isso significa que cada palavra conta. E muito.

QOSHE - O Governo e os média noticiosos - Felisbela Lopes
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O Governo e os média noticiosos

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29.03.2024

Ao contrário do habitual, desta vez o primeiro-ministro indigitado conseguiu formar Governo longe do espaço público mediático. Até ao dia de ontem em que partilhou os nomes dos ministros com o presidente da República, não houve fugas de informação. Isso é bastante positivo. No entanto, o exercício de governação não deve seguir o mesmo distanciamento em relação aos média noticiosos. Este novo ciclo político impõe uma regular prestação de contas e a constituição de canais através dos quais circule uma informação relevante e rigorosa.

Não será fácil a governabilidade do país. Impossibilitado de governar apenas por decretos, o novo primeiro-ministro terá de se........

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