A saída de Augusto Santos Silva da Assembleia da República não é apenas uma vitória do Chega, uma desforra de André Ventura ou uma derrota, mais uma, do PS. É, sobretudo, o sinal do desgaste de uma certa postura e forma de fazer política com que grande parte dos eleitores já não se identifica, já não se revê.

É certo que, quando votaram, os eleitores pelo círculo de fora da Europa não estavam a avaliar a prestação do presidente do Parlamento junto das comunidades. A maior parte dos emigrantes, sejamos francos, nem sabia que Augusto Santos Silva era o seu representante desde 2022. Portanto, Augusto Santos Silva não terá perdido “a batalha”, recorrendo a palavras do próprio após serem conhecidos os resultados dos votos dos emigrantes. Não se tratou de um fracasso individual, mas sim coletivo.

A vitória do Chega (terceiro no território nacional e primeiro nos círculos da emigração, com 18,30% dos votos e dois deputados, contra um do PS e um da AD) não está relacionada apenas com a falta de soluções dos socialistas e sociais-democratas verificada nas últimas décadas e que se reflete nos temas da saúde, habitação, justiça e educação, entre outros. O facto de os quatro partidos fundadores da democracia, PS, PSD, CDS e PCP, terem perdido alcance expressa uma mudança inevitável e, provavelmente, imparável.

Explicar o desaire de Augusto Santos Silva no Brasil (onde o Chega alcançou 13 724 votos e o PS 8536) apenas com campanhas de desinformação levadas a cabo por apoiantes do ex-presidente Jair Bolsonaro é curto, muito curto, além de ser injusto para todos os emigrantes, nesse e em todos os outros países, que elegeram os seus representantes para o Parlamento português. Os emigrantes não podem estar na agenda política apenas no Dia de Portugal e das Comunidades. Da Arábia Saudita ao Canadá, é isso que sentem. Quem tem familiares a trabalhar fora do país sabe-o bem.

As escolhas estão feitas. É assim que funciona a democracia.

QOSHE - Emigrantes não são segundo plano - Manuel Molinos
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Emigrantes não são segundo plano

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22.03.2024

A saída de Augusto Santos Silva da Assembleia da República não é apenas uma vitória do Chega, uma desforra de André Ventura ou uma derrota, mais uma, do PS. É, sobretudo, o sinal do desgaste de uma certa postura e forma de fazer política com que grande parte dos eleitores já não se identifica, já não se revê.

É certo que, quando votaram, os eleitores pelo círculo de fora da Europa não estavam a avaliar a prestação do presidente do Parlamento junto das comunidades. A maior parte........

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