Portugal é o país da Europa Ocidental e Ásia Central com a maior percentagem de crianças institucionalizadas. Cerca de 95% das crianças portuguesas ao abrigo do sistema de promoção e proteção estão em acolhimento residencial. É a percentagem mais elevada entre 42 países da Europa Ocidental e Ásia Central.

A situação agrava-se quando se trata de menores portadores de deficiência. Estas crianças têm maior probabilidade de serem colocadas em instituições, ou seja, em unidades de acolhimento residencial. 14% das crianças institucionalizadas têm uma deficiência.

Estes números esbarram na mais elementar tarefa que cabia ao Estado: salvaguardar o superior interesse das crianças, sobretudo, daquelas que estão em situação de maior vulnerabilidade. Mas os números esbarram também nas recomendações internacionais que apontam para o acolhimento familiar, como a opção que salvaguarda melhor o interesse das crianças. E os números esbarram também na lei portuguesa que, desde 2015, consagra o acolhimento familiar como o regime preferencial para estas crianças, em detrimento do acolhimento residencial. Mas o Estado português continua a ser indiferente a tudo isto, e a fazer do acolhimento familiar uma espécie de nota de rodapé do sistema de promoção e proteção de crianças.

Se é clara a inexistência de uma cultura em Portugal promotora do acolhimento familiar, a que se conjuga um generalizado desconhecimento desta opção, a verdade é que o poder político não fez do acolhimento familiar uma aposta nos últimos anos. Ou não o fez com resultados efetivos para milhares de crianças que poderiam estar em famílias de acolhimento e continuam institucionalizadas.

A incompreensão desta realidade é superada pela indignação face ao que se passou há poucos dias na Assembleia da República. Muito recentemente houve propostas no Parlamento apresentadas para que as famílias de acolhimento pudessem ser candidatas à adoção. Todos os partidos votaram favoravelmente estas propostas. Todos menos um: o Partido Socialista. Tendo o PS maioria parlamentar, estas propostas foram sonoramente chumbadas. Ou melhor, este chumbo que ofende e periga o que de mais básico o Estado deveria garantir a estas crianças - o direito a uma família - acabou por passar despercebido da espuma mediática. Não passou, contudo, incólume junto de quem acompanha estas matérias e para quem é incompreensível vedar o acesso destas crianças a uma família.

Somos frequentemente avaliados em estudos e rankings internacionais e - em regra - aparecemos quase sempre mal posicionados. Mas este retrato feito pela UNICEF é um dos piores e que mais nos deveria indignar e envergonhar.

QOSHE - O pior - Margarida Balseiro Lopes
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O pior

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20.01.2024

Portugal é o país da Europa Ocidental e Ásia Central com a maior percentagem de crianças institucionalizadas. Cerca de 95% das crianças portuguesas ao abrigo do sistema de promoção e proteção estão em acolhimento residencial. É a percentagem mais elevada entre 42 países da Europa Ocidental e Ásia Central.

A situação agrava-se quando se trata de menores portadores de deficiência. Estas crianças têm maior probabilidade de serem colocadas em instituições, ou seja, em unidades de acolhimento residencial. 14% das crianças institucionalizadas têm uma deficiência.

Estes números esbarram na mais elementar tarefa que cabia ao Estado: salvaguardar o........

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