Último dia antes do sábado de reflexão final. Triste sina a daqueles que votaram antes do tempo - no contraponto da indecisão que ainda teima em abalar 15 a 20% dos eleitores - impossibilitados, por decisão individual, de votar sem a ponderação desta última semana de campanha. Perderam os derradeiros jogos florais mas ganharam em convicção. Valentes e certeiros. Tudo o que se passa nas últimas horas de campanha é o desenrolar do aperto, respostas reactivas e nervosas aos números das sondagens que, sabemos bem, valem o que valem mas afligem. O Chega invadiu o recreio e desfaz-se em contradições, a AD sente-se vitoriosa apesar das “red flags” vermelhas e históricas que agitou nos últimos dias, o PS reapresentou António Costa pouco antes do final do filme, IL/BE/ CDU/PAN/Livre tentam ganhar relevância na interpretação do melhor papel secundário. Está a chegar uma noite de eleições que será de Oscars e de futebol português em aperto de calendário. Um domingo gordo que se precipitará para uma segunda-feira de balanços finais.

Nunca a interpretação foi tão permanente, nunca o juízo foi tão valorado, nunca a amplificação das tendências foi tão vasta. Nunca houve, também, comentário político tão alinhado e desequilibrado. Em 2023, contas feitas ao espectro de comentário político nas televisões portuguesas, a Direita vence por números esmagadores: 37 contra 25 comentadores. Mulheres são apenas 24%. Aos domingos, Paulo Portas e Marques Mendes em canal aberto. Nesta campanha eleitoral, como qualquer zapping atento torna perceptível, à excepção do agora habitual equilíbrio da RTP, cerca de 80% dos comentadores são de Direita. Se tempos houve (por exemplo, em 2016) em que a Esquerda conseguia alguma paridade nas televisões, o contexto actual é de uma assimetria evidente que mina a pluralidade, a democracia e um julgamento de equilíbrio. Raramente há contraditório, há tiro ao alvo.

Olhar para o espectro da indecisão ajuda a adensar as dúvidas sobre as soluções governativas. Depois da dinamitação das sondagens que previam um empate técnico (ou até a vitória do PSD) e deram de caras com um choque de realidade numa maioria absoluta do PS em 2022, ninguém arrisca acreditar em prognósticos. Todo este jogo, entre parágrafos e notícias antecipadamente escritas, atirou a política para um campo minado onde ninguém aposta num cenário de estabilidade mesmo após a ida às urnas. A reedição da velha “geringonça” foi e será, ainda assim, a referência mais provável para quem almeja tempos de estabilidade. Agora, com alguém que nela acredita, ao contrário de António Costa. Aí, Pedro Nuno Santos convence por convicção e peso da História. Era ele, de facto, o “primeiro-ministro da geringonça” de Costa.

QOSHE - A geringonça como referência - Miguel Guedes
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A geringonça como referência

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08.03.2024

Último dia antes do sábado de reflexão final. Triste sina a daqueles que votaram antes do tempo - no contraponto da indecisão que ainda teima em abalar 15 a 20% dos eleitores - impossibilitados, por decisão individual, de votar sem a ponderação desta última semana de campanha. Perderam os derradeiros jogos florais mas ganharam em convicção. Valentes e certeiros. Tudo o que se passa nas últimas horas de campanha é o desenrolar do aperto, respostas reactivas e nervosas aos números das sondagens que, sabemos bem, valem o que valem mas afligem. O Chega invadiu o recreio e desfaz-se em contradições, a AD sente-se vitoriosa apesar das “red flags” vermelhas e históricas que agitou nos........

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