O final do ano aproxima-se vertiginosamente e, como sempre acontece, há memórias, pessoais e coletivas, que vamos querer preservar, ainda que haja, em número bastante mais expressivo, ambições que sabemos perdidas nos 12 meses que agora enterramos. As resoluções de ano novo valem o que valem (nada!), mas têm o frugal condão de nos situar perante a importância das coisas, das pessoas e em particular de nos colocar ante a perspetiva da revisitada desilusão. Muito pouco do que sonhamos é traduzido em realizações palpáveis, mesmo que, a todos os 31 de dezembro, invoquemos valores universais, humanistas e que, bem lá no fundo, acreditemos que a míngua dos dias no calendário nos providencia uma clarividência inatacável. Ainda assim, vamos arriscar uma singela e incompleta lista de desejos, certos de que a necessidade de que se materializem colide com a ingenuidade sadia que é o dínamo de qualquer sonhador. Vamos a eles, então.

Que em 2024 não haja portugueses a morrer (nem a pisar esse risco) nos hospitais, centros de saúde ou em viagens entre urgências, por falta de assistência médica, seja nos pujantes núcleos urbanos, seja nas geografias mais recônditas para onde voltamos para fazer turismo nos intervalos da vida apressada da cidade. Que a discussão sobre o Serviço Nacional de Saúde não seja uma batalha ideológica alimentada pela cegueira de quem ainda acredita que o sistema apenas sobrevive numa base pública, excluindo o setor social e os privados. Ou vamos mesmo ignorar que há quase 3,6 milhões de portugueses com seguro de saúde?

Que em 2024, ano de eleições legislativas, os partidos, e a classe política de uma forma geral, olhem mais para Portugal e menos para o umbigo. Que nos falem verdade, que nos apresentem uma ideia para o país, que nos seja dada a faculdade de não emigrarmos, de podermos fixar aqui os nossos filhos, de lhes darmos uma casa e um trabalho estável. A habitação é um tema patriótico que, se não for atacado com seriedade e unidade interpartidária, arrisca transformar-se numa rutura geracional sem possibilidade de cura.

Que em 2024 a justiça deixe de querer fazer política e que a política deixe de uma vez por todas de querer ser justiceira.

Que em 2024 nos deixem com mais dinheiro no bolso, pagando menos impostos. Mas que o façam mantendo as contas públicas sadias, sem hipotecar o futuro dos que ainda se farão gente.

Que em 2024 todos ganhemos juízo, que façamos andar para a frente este país maravilhoso, valorizando os que nutrem esse desejo, acolhendo quem nos escolhe como casa e dando uma resposta a todos, alicerçados no princípio evolutivo de que Portugal não pertence a ninguém, mas a todos os portugueses.

Que em 2024 estejamos aqui para lamentar que nada disto foi cumprido. Ansiando galhardamente por 2025.

QOSHE - Lista de desejos para 2024 que não vai ser cumprida - Pedro Ivo Carvalho
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Lista de desejos para 2024 que não vai ser cumprida

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25.12.2023

O final do ano aproxima-se vertiginosamente e, como sempre acontece, há memórias, pessoais e coletivas, que vamos querer preservar, ainda que haja, em número bastante mais expressivo, ambições que sabemos perdidas nos 12 meses que agora enterramos. As resoluções de ano novo valem o que valem (nada!), mas têm o frugal condão de nos situar perante a importância das coisas, das pessoas e em particular de nos colocar ante a perspetiva da revisitada desilusão. Muito pouco do que sonhamos é traduzido em realizações palpáveis, mesmo que, a todos os 31 de dezembro, invoquemos valores universais, humanistas e que, bem lá no fundo, acreditemos que a míngua dos dias no calendário nos providencia uma........

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