1 - Colocados, agora, numa espécie de limbo entre um governo a cessar funções e outro a preparar-se para tomar posse, e enquanto cada um ainda tenta dar justificações sobre o que se passou no dia 10 de março, o país vai ser colocado perante uma das suas maiores provas desde o resgate da liberdade, a 25 de Abril de 1974. De um cenário político estável, invejado pela maioria dos países que partilham connosco o espaço europeu, viajamos para outro, onde a cada trimestre se verá se as próximas eleições estão mais próximas ou mais distantes. É que começa a ficar na moda que em Portugal as legislaturas não durem quatro anos; um luxo a que o país, ao que parece, se pode dar, tal o afã dissolutivo. O que ficará, para já, para a história da democracia é uma segunda dissolução da Assembleia da República levada a cabo no atual mandato do Presidente da República, e quanto ao parágrafo do comunicado do Ministério Público que levantava suspeitas sobre o Primeiro-Ministro, quatro meses depois do episódio, o país democrático continua à espera dos obrigatórios desenvolvimentos sobre as suspeitas levantadas que levaram à queda de um Governo de maioria absoluta eleito há apenas dois anos. Esta é apenas uma amostra de um passado recente que, é certo, permanece lá atrás, imóvel, mas que conseguiu mover o país para novas eleições por decisão de Marcelo Rebelo de Sousa num momento conturbado para a Europa e para o mundo. Para além desta espera por novidades em relação ao ainda primeiro-ministro, a esmagadora maioria do país também aguarda que os fortes sinais dados pelo futuro primeiro-ministro, Luís Montenegro, em relação ao que se passa

à sua direita, se consigam manter, apesar das pressões que já estão latentes. O “não é não” assumido está, de resto, a ser insistentemente vincado por alguns responsáveis do PSD. E é precisamente isso que muitos esperam de um dos partidos fundadores da democracia portuguesa.

2 - Todos os votos são testemunho da democracia, independentemente das escolhas de cada um. Mas nos rescaldos das eleições legislativas, o tema da representatividade obtida através desses votos costuma vir

à tona. É sabido que o método de representatividade nos círculos eleitorais que tendem a eleger menos deputados, prejudica os pequenos partidos. E é fundamentalmente isso que se passa no Interior. O número de mandatos estão indexados ao número de eleitores inscritos e quanto menos população, menos deputados cada distrito elegerá para a Assembleia da República. O JF dá conta nesta edição do trajeto da Beira Interior em relação ao número de mandatos atribuídos, desde as primeiras eleições para a Constituinte, em 25 de abril de 1975, até às do recente dia 10 de março. Neste período, os distritos de Castelo Branco e da Guarda passaram de 13 deputados para sete. Ou seja, perdemos quase metade dos eleitos em menos de 50 anos. E porque é que os perdemos? Porque temos cada vez menos população. Nada de novo, portanto. O que poderia — e deveria ­— ser novo seria a introdução de novos critérios de atribuição de mandatos que vão para além do mero número de eleitores. Porque se assim não for, o caminho que se afigura a médio prazo é o de chegarmos ao patamar mínimo dos dois deputados eleitos em cada um destes distritos. Isto, numa área com 26 municípios e quase 13 mil quilómetros quadrados...

QOSHE - A espera, os votos e os mandatos - Nuno Francisco
menu_open
Columnists Actual . Favourites . Archive
We use cookies to provide some features and experiences in QOSHE

More information  .  Close
Aa Aa Aa
- A +

A espera, os votos e os mandatos

3 0
20.03.2024

1 - Colocados, agora, numa espécie de limbo entre um governo a cessar funções e outro a preparar-se para tomar posse, e enquanto cada um ainda tenta dar justificações sobre o que se passou no dia 10 de março, o país vai ser colocado perante uma das suas maiores provas desde o resgate da liberdade, a 25 de Abril de 1974. De um cenário político estável, invejado pela maioria dos países que partilham connosco o espaço europeu, viajamos para outro, onde a cada trimestre se verá se as próximas eleições estão mais próximas ou mais distantes. É que começa a ficar na moda que em Portugal as legislaturas não durem quatro anos; um luxo a que o país, ao que parece, se pode dar, tal o afã dissolutivo. O que ficará, para já, para a história da democracia é uma segunda dissolução da Assembleia da República levada a cabo no atual mandato........

© Jornal do Fundão


Get it on Google Play