A cidade da Covilhã acolheu na última quinta-feira uma importante jornada em torno da imprensa. Dezenas de convidados de todo o país, sobretudo editores de jornais e revistas, participaram no Dia Nacional da Imprensa, organizado pela Associação Nacional de Imprensa, a maior representante do setor em Portugal. Foi uma longa e profícua jornada, onde os órgãos de comunicação se reuniram para debater o presente e o futuro de um setor de vital importância para as sociedades democráticas. Não me cabe a mim - nem quero - fazer sublinhados sobre a importância do jornalismo nas sociedades, como se estivesse a tentar vender algo. Não somos nós que o dizemos, curiosamente. É o processo histórico e é o público que o reitera em todos os minutos do dia à escala global. Há uma tendência de se associar a quebra das tiragens em papel ao declínio do jornalismo, como se o meio onde se entrega a informação estivesse intimamente ligado à função. Pois bem, a informação produzida por muitos títulos nunca terá sido tão lida como agora. Só ficará surpreso com esta “novidade” quem não andar atento ao que se passa. Se muitos jornais e revistas somarem as audiências do papel ao crescimento explosivo do consumo digital, estas ultrapassam largamente as fronteiras que antes eram delimitadas pelas margens do papel. O papel de jornal e de revista é apenas uma forma de entregar conteúdos jornalísticos, com as qualidades e limitações que lhe estão associadas. E este mesmo papel é, também, um meio cada vez mais caro para se entregar informação. E arriscado, porque os CTT insistem em não cumprir aquilo para os quais são pagos pelos editores: Entregarem os jornais a tempo e horas aos assinantes. Esta é a primeira grande confusão que se vive: A mistura entre a função (jornalismo) e o suporte (papel); uma confusão que dá sempre jeito a quem gosta de criticar os jornalistas e o jornalismo, com motivos cada vez mais encapotados e com razões cada vez menos menos ingénuas, mas que bem se percebem. É nesta aparente contradição que se coloca o grande problema, para o qual os poderes públicos em Portugal - ao contrário do que se passa já noutros países da Europa - continuam arredados: O financiamento. As empresas jornalísticas sempre viveram das audiências, dos leitores que confiam num título para se informarem, comprando avulso ou assinando um jornal. Naturalmente que quanto maior for a expansão e a importância desse jornal, maior será o seu potencial para cativar publicidade. Então, se muitos jornais aumentaram a audiência por causa do advento do digital, porque não conseguiram, como sempre fizeram, potenciar essa crescente ligação com os leitores para garantir a sustentabilidade das empresas? Porque, simplesmente, a quebra dos rendimentos associados à circulação em papel não foram compensados pelo crescimento no digital, um universo mais complexo, onde impera a cultura da gratuitidade, onde os agregadores, motores de busca e as redes sociais geram tráfego - e muitos milhões de lucro - com conteúdos jornalísticos sem que quem os produza seja devidamente recompensado. De resto, a associação de imprensa espanhola revelou na semana passada que vai processar a Meta, dona do Facebook e do Instagram, por “concorrência desleal” no mercado publicitário, exigindo 550 milhões de euros de indemnização. Enquanto não se reequilibrarem as forças, continuaremos a falar de crise. E enquanto isso se dá com um dos esteios de uma sociedade democrática, em Portugal, o Estado ainda assobia para o lado.

QOSHE - Um dia para pensar a imprensa - Nuno Francisco
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Um dia para pensar a imprensa

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13.12.2023

A cidade da Covilhã acolheu na última quinta-feira uma importante jornada em torno da imprensa. Dezenas de convidados de todo o país, sobretudo editores de jornais e revistas, participaram no Dia Nacional da Imprensa, organizado pela Associação Nacional de Imprensa, a maior representante do setor em Portugal. Foi uma longa e profícua jornada, onde os órgãos de comunicação se reuniram para debater o presente e o futuro de um setor de vital importância para as sociedades democráticas. Não me cabe a mim - nem quero - fazer sublinhados sobre a importância do jornalismo nas sociedades, como se estivesse a tentar vender algo. Não somos nós que o dizemos, curiosamente. É o processo histórico e é o público que o reitera em todos os minutos do dia à escala global. Há uma tendência de se associar a quebra das tiragens em papel ao declínio do jornalismo, como se o meio onde........

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