A campanha eleitoral tem sido marcada por discussões sobre política fiscal. Os argumentos são frequentemente superficiais e mal explicados, servindo meramente o propósito de acicatar a arena política. Mas as consequências das diferentes propostas não são despiciendas.
Durante a legislatura, o Governo ainda em funções insistiu em privilegiar o equilíbrio orçamental, impondo restrições sobre a despesa pública e assim deixando alastrar problemas que são hoje o leitmotiv de todos os partidos da oposição. Em campanha, o incumbente afasta-se timidamente do objetivo das “contas certas”. Terá aprendido com os erros?
Mas eis que, do outro lado, surge uma solução milagrosa: reduzir impostos – a fórmula mágica para os entraves ao crescimento económico – e, simultaneamente, resolver problemas como a habitação, o SNS ou o congelamento dos salários dos professores. E, claro, sem descurar “as contas certas”.
Para os mais distraídos, arrogo-me dizer que a literatura económica tem sérias reservas quanto à possibilidade de um “choque fiscal” ter um efeito expansionista, seja através de um corte nos impostos sobre o rendimento das famílias ou sobre os lucros das empresas. A própria experiência não confirma a bondade desta política.
Do lado do rendimento, sendo os mais ricos aqueles que pagam mais impostos, mas também aqueles que mais poupam, a redução fiscal traduzir-se-á num aumento da poupança, refreando o acréscimo da procura agregada e assim atenuando o efeito expansionista.
Do lado das empresas, os impostos são pagos sobretudo pelas que têm escala, pelo que reduzir o IRC será uma benesse para as que têm maior dimensão – quem esqueceu os lucros extraordinários reportados pelas grandes empresas portuguesas nos últimos dois anos? – e resultará numa perda avultada de receita fiscal para o Estado. Maior poupança não se traduz obrigatoriamente em maior investimento.
Sobre o comportamento das e dos grandes, é aconselhável folhear o Relatório sobre evasão fiscal global publicado pelo Observatório Fiscal da União Europeia, um laboratório de investigação independente da Paris School of Economics.
Escrevem os autores que a evasão fiscal é cada vez mais um problema nacional. Os multimilionários mundiais utilizam empresas-fantasma para contornar a tributação dos rendimentos, tendo taxas de imposto efetivas entre 0% a 0,5% da sua riqueza.
A solução? Impostos progressivos e cooperação internacional para taxar os ultra-ricos e as grandes empresas multinacionais.
É que a economia tem destas coisas. Primeiro, há que entender a sua mecânica, mas não sem perder de vista que, à la longue, os seus impactos são sobretudo sociais.
Política fiscal, algum bê-á-bá
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08.03.2024
A campanha eleitoral tem sido marcada por discussões sobre política fiscal. Os argumentos são frequentemente superficiais e mal explicados, servindo meramente o propósito de acicatar a arena política. Mas as consequências das diferentes propostas não são despiciendas.
Durante a legislatura, o Governo ainda em funções insistiu em privilegiar o equilíbrio orçamental, impondo restrições sobre a despesa pública e assim deixando alastrar problemas que são hoje o leitmotiv de todos os partidos da oposição. Em campanha, o incumbente afasta-se timidamente do objetivo das “contas certas”. Terá aprendido com os erros?
Mas eis que, do outro lado, surge uma solução milagrosa:........
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