África do Sul v. Israel

O Tribunal Internacional de Justiça irá decidir da aplicação da Convenção para a prevenção e a repressão do crime de genocídio aos actos praticados pelo Estado de Israel na faixa de Gaza.

O ano de 2024 não terminou sem que, a 29 de Dezembro, se abrisse perante o TIJ mais um litígio. A República da África do Sul peticionou a violação pelo Estado de Israel da convenção para a prevenção e repressão do crime de genocídio, de 9 de Dezembro de 1948. A invocação desta convenção é frequente perante o TIJ não porque a factualidade referida pelos queixosos integre necessariamente aquele tipo de crime mas porque a Convenção, via artigo IX, concede o acesso ao TIJ para solução jurisdicional dos conflitos emergentes da sua aplicação.

O crime de genocídio integra um elemento subjectivo, “a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso” (artigo 2º). A prova deste dolus specialis não é fácil e a petição da África do Sul dedica-lhe o extenso § 101 com transcrição de declarações públicas de membros do Governo, Deputados e chefes militares que preencheriam o tipo subjectivo.

A petição também faz uma contabilização das declarações públicas de chefes de Estado e de Governo e de Ministros de Estados terceiros que qualificaram como práticas genocidas as operações militares das Forças de Defesa de Israel na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. A África do Sul espera que alguns destes Estados venham a intervir na acção intentada junto do TIJ, ao abrigo dos artigos 62º e 63º do respectivo Estatuto.

O §131 da petição convoca a natureza erga omnes das obrigações impostas pela Convenção do Genocídio: “In such a convention the contracting States do not have any interests of their own; they merely have, one and all, a common interest, namely, the accomplishment of those high purposes which are the raison d’être of the convention. Consequently, in a convention of this type one cannot speak of individual advantages or disadvantages to States, or of the maintenance of a perfect contractual balance between rights and duties. The high ideals which inspired the Convention provide, by virtue of the common will of the parties, the foundation and measure of all its provisions.” (“The Gambia v. Myanmar, Provisional Measures, Order of 23 January 2020, p. 17, para. 41, quoting its Advisory Opinion on Reservations to the Convention on the Prevention and Punishment of the Crime of Genocide, Advisory Opinion of 28 May 1951, I.C.J. Reports 1951, p. 23”).

A África do Sul defende a autonomia dos procedimentos que venham a ser desencadeados pelo Procurador junto do Tribunal Penal Internacional (TPI), desde logo com base nas queixas que já apresentou (cf. a nota de rodapé 130 na petição). O TPI decidirá da responsabilidade individual de quem tenha cometido um crime de genocídio. O TIJ decidirá da violação da Convenção do Genocídio pelo Estado de Israel.

A África do Sul pede também o decretamento de medidas provisórias ao abrigo do artigo 41º do estatuto, para preservar os direitos de cada parte. O TIJ agendou para os dias 11 e 12 de Janeiro as audiências públicas para ouvir as Partes quanto às medidas provisórias. Em decisões recentes, nomeadamente no caso Gâmbia v. Myanmar (violação da Convenção do Genocídio no caso do povo Roinga), decisão de 23 de Janeiro de 2020, § 86, no caso Ucrânia vs. Federação Russa (falsa invocação da violação da Convenção do Genocídio), decisão de 16 de Março de 2022, § 86, o TIJ decretou medidas provisórias contra Myanmar e a Federação Russa para cessarem as violações da Convenção.

O ano de 2024 não terminou sem que, a 29 de Dezembro, se abrisse perante o TIJ mais um litígio. A República da África do Sul peticionou a violação pelo Estado de Israel da convenção para a prevenção e repressão do crime de genocídio, de 9 de Dezembro de 1948. A invocação desta convenção é frequente perante o TIJ não porque a factualidade referida pelos queixosos integre necessariamente aquele tipo de crime mas porque a Convenção, via artigo IX, concede o acesso ao TIJ para solução jurisdicional dos conflitos emergentes da sua aplicação.

O crime de genocídio integra um elemento subjectivo, “a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso” (artigo 2º). A prova deste dolus specialis não é fácil e a petição da África do Sul dedica-lhe o extenso § 101 com transcrição de declarações públicas de membros do Governo, Deputados e chefes militares que preencheriam o tipo subjectivo.

A petição também faz uma contabilização das declarações públicas de chefes de Estado e de Governo e de Ministros de Estados terceiros que qualificaram como práticas genocidas as operações militares das Forças de Defesa de Israel na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. A África do Sul espera que alguns destes Estados venham a intervir na acção intentada junto do TIJ, ao abrigo dos artigos 62º e 63º do respectivo Estatuto.

O §131 da petição convoca a natureza erga omnes das obrigações impostas pela Convenção do Genocídio: “In such a convention the contracting States do not have any interests of their own; they merely have, one and all, a common interest, namely, the accomplishment of those high purposes which are the raison d’être of the convention. Consequently, in a convention of this type one cannot speak of individual advantages or disadvantages to States, or of the maintenance of a perfect contractual balance between rights and duties. The high ideals which inspired the Convention provide, by virtue of the common will of the parties, the foundation and measure of all its provisions.” (“The Gambia v. Myanmar, Provisional Measures, Order of 23 January 2020, p. 17, para. 41, quoting its Advisory Opinion on Reservations to the Convention on the Prevention and Punishment of the Crime of Genocide, Advisory Opinion of 28 May 1951, I.C.J. Reports 1951, p. 23”).

A África do Sul defende a autonomia dos procedimentos que venham a ser desencadeados pelo Procurador junto do Tribunal Penal Internacional (TPI), desde logo com base nas queixas que já apresentou (cf. a nota de rodapé 130 na petição). O TPI decidirá da responsabilidade individual de quem tenha cometido um crime de genocídio. O TIJ decidirá da violação da Convenção do Genocídio pelo Estado de Israel.

A África do Sul pede também o decretamento de medidas provisórias ao abrigo do artigo 41º do estatuto, para preservar os direitos de cada parte. O TIJ agendou para os dias 11 e 12 de Janeiro as audiências públicas para ouvir as Partes quanto às medidas provisórias. Em decisões recentes, nomeadamente no caso Gâmbia v. Myanmar (violação da Convenção do Genocídio no caso do povo Roinga), decisão de 23 de Janeiro de 2020, § 86, no caso Ucrânia vs. Federação Russa (falsa invocação da violação da Convenção do Genocídio), decisão de 16 de Março de 2022, § 86, o TIJ decretou medidas provisórias contra Myanmar e a Federação Russa para cessarem as violações da Convenção.

África do Sul v. Israel

O Tribunal Internacional de Justiça irá decidir da aplicação da Convenção para a prevenção e a repressão do crime de

Global Media. CEO afinal está disponível para ser ouvido no Parlamento

Trabalhadores da Global Media, que não receberam os seus salários de dezembro, convocaram uma greve para o dia 10 de

Comissão Executiva do 5.º Congresso dos Jornalistas decide manter preço de inscrição

O objetivo é que o máximo de jornalistas com carteira profissional participem no evento.

A Ignorância Não Aproveita a Ninguém, em Democracia

. Um professor é um pedagogo e a disciplina de Educação Física tem de incluir aulas teóricas de psicologia prática, n

Dezembro com mais compras, quer físicas, quer online

As compras em loja através do serviço MB Way cresceram 1,8 vezes, enquanto as compras ‘online’ subiram 1,7 vezes face

Francisco Assis encabeça lista para a Comissão Nacional do PS

Congresso começa na sexta-feira.

Declaração sobre bênçãos de casais do mesmo sexo não é "herética (...) ou blasfema"

Na declaração é indicado que é "fundamental" que as conferências episcopais "não apoiem uma doutrina diferente da dec

Guerra. ONU preocupada com apelo à "transferência" de palestinianos para fora de Gaza

O direito internacional proíbe a transferência forçada de pessoas protegidas dentro de um território ocupado ou a sua

Morreu Ruy Mingas, político, poeta e músico angolano

Tinha 84 anos.

1

Caso das gémeas. Ministra da Justiça diz que "não fazia sentido" que o processo fosse encarado como

2

Mulheres detidas por burla no Porto

3

A1. Militar em estado grave após acidente com camião do Exército

4

Presidente da República promulga com "várias reservas" revisão do sistema de avaliação da função púb

5

Alexandre Fonseca sai da Altice por mútuo acordo

6

Comprar ou arrendar? A difícil escolha num mercado de preços altos

19:53

África do Sul v. Israel

19:17

Global Media. CEO afinal está disponível para ser ouvido no Parlamento

18:40

Comissão Executiva do 5.º Congresso dos Jornalistas decide manter preço de inscrição

18:39

A Ignorância Não Aproveita a Ninguém, em Democracia

17:52

Dezembro com mais compras, quer físicas, quer online

17:46

Francisco Assis encabeça lista para a Comissão Nacional do PS

QOSHE - África do Sul v. Israel - Mário João Fernandes
menu_open
Columnists Actual . Favourites . Archive
We use cookies to provide some features and experiences in QOSHE

More information  .  Close
Aa Aa Aa
- A +

África do Sul v. Israel

6 0
04.01.2024

África do Sul v. Israel

O Tribunal Internacional de Justiça irá decidir da aplicação da Convenção para a prevenção e a repressão do crime de genocídio aos actos praticados pelo Estado de Israel na faixa de Gaza.

O ano de 2024 não terminou sem que, a 29 de Dezembro, se abrisse perante o TIJ mais um litígio. A República da África do Sul peticionou a violação pelo Estado de Israel da convenção para a prevenção e repressão do crime de genocídio, de 9 de Dezembro de 1948. A invocação desta convenção é frequente perante o TIJ não porque a factualidade referida pelos queixosos integre necessariamente aquele tipo de crime mas porque a Convenção, via artigo IX, concede o acesso ao TIJ para solução jurisdicional dos conflitos emergentes da sua aplicação.

O crime de genocídio integra um elemento subjectivo, “a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso” (artigo 2º). A prova deste dolus specialis não é fácil e a petição da África do Sul dedica-lhe o extenso § 101 com transcrição de declarações públicas de membros do Governo, Deputados e chefes militares que preencheriam o tipo subjectivo.

A petição também faz uma contabilização das declarações públicas de chefes de Estado e de Governo e de Ministros de Estados terceiros que qualificaram como práticas genocidas as operações militares das Forças de Defesa de Israel na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. A África do Sul espera que alguns destes Estados venham a intervir na acção intentada junto do TIJ, ao abrigo dos artigos 62º e 63º do respectivo Estatuto.

O §131 da petição convoca a natureza erga omnes das obrigações impostas pela Convenção do Genocídio: “In such a convention the contracting States do not have any interests of their own; they merely have, one and all, a common interest, namely, the accomplishment of those high purposes which are the raison d’être of the convention. Consequently, in a convention of this type one cannot speak of individual advantages or disadvantages to States, or of the maintenance of a perfect contractual balance between rights and duties. The high ideals which inspired the Convention provide, by virtue of the common will of the parties, the foundation and measure of all its provisions.” (“The Gambia v. Myanmar, Provisional Measures, Order of 23 January 2020, p. 17, para. 41, quoting its Advisory Opinion on Reservations to the Convention on the Prevention and Punishment of the Crime of Genocide, Advisory Opinion of 28 May........

© Jornal i


Get it on Google Play