No Dia Universal dos Direitos da Criança, a UNICEF divulgou os dados de um inquérito feito em Portugal a quase 12 mil crianças e jovens. Este estudo concluiu que 70% dos inquiridos sentem que os adultos nunca ou raramente lhes pedem opinião, um valor um pouco abaixo do de 2021 (76%).

Se por um lado estes resultados podem ser preocupantes, por outro mostram-nos também o seu contrário: atualmente estamos atentos e mostramos interesse pela opinião dos mais novos, o que se traduz, por exemplo, nesta sondagem. Há umas gerações atrás, quantas organizações teriam a iniciativa de saber se a opinião dos mais jovens era tida em conta ou se influenciava o que era decidido pelos adultos? A resposta seria mais ou menos óbvia. Na grande maioria dos casos, os mais novos não eram ‘tidos nem achados’ para decidir o que quer que fosse e limitavam-se a seguir e a acatar as decisões dos mais velhos.

Atualmente, não só se nota uma maior preocupação em ouvir os mais novos – por exemplo em casa ou na escola – e em tentar que sejam sempre parte ativa das decisões tomadas em que são implicados, como notamos que também estão cada vez mais cientes dos seus direitos, como, precisamente, o direito de participar nas escolhas e decisões, nos vários contextos.

Ou seja, embora este resultado evidencie o sentimento de uma certa exclusão, não significa que estejamos no mau caminho. A tendência é a de que a voz dos mais novos tenha cada vez mais impacto e a intervenção dentro de cada família, em cada escola ou onde for, seja mais procurada e tida em conta. Estes resultados evidenciam, sim, que ainda há muito a fazer.

Desde pequenas as crianças podem e devem ter oportunidade de decisão e de escolha, sobretudo no que lhes diz respeito. Podem começar pelas coisas mais simples como escolher a história que querem ouvir antes de dormir, a roupa que vão vestir, a fruta que vão comer, o parque onde preferem ir, etc. A partir destas pequenas escolhas e decisões, não só ganham mais confiança, como treinam a sua capacidade de escolha e decisão e sentem que a sua opinião é tida em conta. À medida que vão crescendo são pedidas opiniões para situações mais complexas que podem ter implicações também na vida dos outros. Acima de tudo é importante valorizar os mais novos, ouvi-los e principalmente considerar a sua opinião, fazer com que sintam que têm um papel ativo no grupo onde estão inseridos, seja ele a família, a escola ou outro. E não ignorar, desvalorizar ou ridicularizar as opiniões ou ideias, mesmo quando é difícil que não pareçam absurdas ou despropositadas: ‘Ir ao jardim zoológico esta noite poderia ser uma excelente ideia, todos adoraríamos, mas infelizmente já estamos um pouco cansados e os animais também já devem estar a dormir’.

Por outro lado, importa fazer com que sintam que têm um papel a desempenhar no crescimento do grupo. É bom que se acostumem não só a partilhar o seu pensamento e ideias, mas também a serem ativos, a cumprirem tarefas, a estarem informados e atentos. No fundo, que sintam que são um elemento único e insubstituível do grupo, que hoje é a família e a escola, e mais tarde será também o emprego e a sociedade. l

Psicóloga na ClinicaLab Rita de Botton
filipachasqueira@gmail.com

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O direito de ser ouvido

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27.11.2023

No Dia Universal dos Direitos da Criança, a UNICEF divulgou os dados de um inquérito feito em Portugal a quase 12 mil crianças e jovens. Este estudo concluiu que 70% dos inquiridos sentem que os adultos nunca ou raramente lhes pedem opinião, um valor um pouco abaixo do de 2021 (76%).

Se por um lado estes resultados podem ser preocupantes, por outro mostram-nos também o seu contrário: atualmente estamos atentos e mostramos interesse pela opinião dos mais novos, o que se traduz, por exemplo, nesta sondagem. Há umas gerações atrás, quantas organizações teriam a iniciativa de saber se a opinião dos mais jovens era tida em conta ou se influenciava o que era decidido pelos adultos? A resposta seria mais ou menos óbvia. Na grande maioria dos casos, os mais novos não eram ‘tidos nem achados’ para decidir o........

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