Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza.

Quer nos citados, que no autor da crónica, há uma visão de desencanto do futuro, não apenas do país, mas da Europa. A sua evolução, no século XX, não foi brilhante: desde a primeira guerra mundial, colonizada pelos Estados Unidos da América, na economia, nas tecnologias, na cultura, na mentalização informativa dos media, assentes nos princípios neoliberais duma democracia que nunca conseguiu ultrapassar a consciência protestante da desigualdade, da xenofobia e do racismo, que lhe foi base de estrutura económica e social nas migrações dos colonizadores provenientes da Europa e, sobretudo, da Inglaterra.

Reconhece-se, por outro lado, que a desestabilização do ambiente planetário resulta da manutenção, há séculos, duma sociedade assente na acumulação do capital, na desigualdade do trabalho, no uso da mão de obra escrava ou sujeita ao limiar da miséria, que, nem o liberalismo do século XIX, nem as revoluções proletárias do século XX, conseguiram alterar de forma profunda.

Ainda hoje, EUA, Rússia e China, ditam as ordens dessas novas repúblicas de escassa democracia do designado Terceiro Mundo, onde às populações se coloca um dilema existencial: ou se submetem, ou emigram.

Percebo que a idade e a mudança vão gerando, sob a pressão crescente da inquietude e, mesmo, raiva, das juventudes sem nenhuma garantia duma vida decente, uma angústia existencial ante a visão dum mundo em que se acreditara poder viver em paz e com dignidade, se estar a desintegrar como um castelo da cartas.

Mas, tudo o que hoje acontece, era legível há mais de 30 anos. Os cientistas já então apontavam que a sociedade de consumo iria consumir tudo, degradar a possibilidade da vida planetária

O desencanto de hoje é o resultado duma opção mundial pela extracção, até ao impossível, dos recursos planetários, para satisfação dos prazeres comodistas das sociedades contemporâneas que, entregues aos seus lazeres, queriam melhores vencimentos, melhores casas, melhores automóveis, melhores instalações para férias, melhores produtos nas mesas das refeições, melhores instrumentos de comunicação e maior velocidade na transferência da informação.

Foi este desinteresse egoísta das classes médias que conduziu à sua própria sufocação. E viram os seus próprios filhos a sufocarem, devido às suas próprias opções. Criou-se uma juventude, como todas as outras, fruto das regras que, os que dominam, impõem à sociedade.

As de hoje, basicamente com o ensino secundário e, grande maioria, com o ensino superior, sente que o seu país lhe não dá as condições que desejam para viver com dignidade. E critica as gerações mais velhas por não conseguirem sair de casa dos pais, ou serem obrigados a emigrar por um vencimento melhor do que, para o mesmo trabalho, teriam na pátria. Optam por uma opção sem luta.

E os que usufruem das mordomias e dos empregos ambicionados, e criaram as regras para os mal pagos que lhes oferecem, saem a público em sua defesa, condenando o Estado, de que recebem a maioria dos rendimentos, que lhes permitem ser as elites num país à beira de colapso.

Se a educação dos jovens falhou no aspecto colectivo, não foi a escola a culpada, mas o que os pais intervenientes da sociedade portuguesa quiseram que a escola pública fosse: o local onde o seu filho tem de ser melhor que o filho do outro; onde se secundariza a solidariedade, o diálogo, o espírito crítico, o respeito pelo outro; onde o que vale é a classificação para a universidade, não o cidadão preparado para intervir activa e eficazmente na sociedade. O Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, tão próximo, quando ouvimos Trump e os seus acólitos da extrema direita espalhados pelo mundo e suportados por Putin. As elites a definirem as regras duma escola onde os seus filhos não andam…

Cuidado com as trombetas!

Já viram algum governante do mundo morrer, ou ficar amputado, ou cego, ou louco, nas guerras que forjam, no ódio que fomentam?

A minha geração nasceu numa ditadura, teve uma guerra colonial em África, durante doze anos, na defesa dos interesses de muito poucos. Conheceu o sofrimento, a doença, a perda de membros, a morte, mas também as prisões, o exílio, o silêncio e a perseguição no emprego.

Resistiu e mudou este país.

O seu lugar continua a ser onde se ama e se sofre, onde se combate e se luta pela democracia, a liberdade, a justiça, o direito à igualdade. Umas vezes recua-se, outras avança-se. Mas não há retrocesso. A vida é militância.

Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza.

Quer nos citados, que no autor da crónica, há uma visão de desencanto do futuro, não apenas do país, mas da Europa. A sua evolução, no século XX, não foi brilhante: desde a primeira guerra mundial, colonizada pelos Estados Unidos da América, na economia, nas tecnologias, na cultura, na mentalização informativa dos media, assentes nos princípios neoliberais duma democracia que nunca conseguiu ultrapassar a consciência protestante da desigualdade, da xenofobia e do racismo, que lhe foi base de estrutura económica e social nas migrações dos colonizadores provenientes da Europa e, sobretudo, da Inglaterra.

Reconhece-se, por outro lado, que a desestabilização do ambiente planetário resulta da manutenção, há séculos, duma sociedade assente na acumulação do capital, na desigualdade do trabalho, no uso da mão de obra escrava ou sujeita ao limiar da miséria, que, nem o liberalismo do século XIX, nem as revoluções proletárias do século XX, conseguiram alterar de forma profunda.

Ainda hoje, EUA, Rússia e China, ditam as ordens dessas novas repúblicas de escassa democracia do designado Terceiro Mundo, onde às populações se coloca um dilema existencial: ou se submetem, ou emigram.

Percebo que a idade e a mudança vão gerando, sob a pressão crescente da inquietude e, mesmo, raiva, das juventudes sem nenhuma garantia duma vida decente, uma angústia existencial ante a visão dum mundo em que se acreditara poder viver em paz e com dignidade, se estar a desintegrar como um castelo da cartas.

Mas, tudo o que hoje acontece, era legível há mais de 30 anos. Os cientistas já então apontavam que a sociedade de consumo iria consumir tudo, degradar a possibilidade da vida planetária

O desencanto de hoje é o resultado duma opção mundial pela extracção, até ao impossível, dos recursos planetários, para satisfação dos prazeres comodistas das sociedades contemporâneas que, entregues aos seus lazeres, queriam melhores vencimentos, melhores casas, melhores automóveis, melhores instalações para férias, melhores produtos nas mesas das refeições, melhores instrumentos de comunicação e maior velocidade na transferência da informação.

Foi este desinteresse egoísta das classes médias que conduziu à sua própria sufocação. E viram os seus próprios filhos a sufocarem, devido às suas próprias opções. Criou-se uma juventude, como todas as outras, fruto das regras que, os que dominam, impõem à sociedade.

As de hoje, basicamente com o ensino secundário e, grande maioria, com o ensino superior, sente que o seu país lhe não dá as condições que desejam para viver com dignidade. E critica as gerações mais velhas por não conseguirem sair de casa dos pais, ou serem obrigados a emigrar por um vencimento melhor do que, para o mesmo trabalho, teriam na pátria. Optam por uma opção sem luta.

E os que usufruem das mordomias e dos empregos ambicionados, e criaram as regras para os mal pagos que lhes oferecem, saem a público em sua defesa, condenando o Estado, de que recebem a maioria dos rendimentos, que lhes permitem ser as elites num país à beira de colapso.

Se a educação dos jovens falhou no aspecto colectivo, não foi a escola a culpada, mas o que os pais intervenientes da sociedade portuguesa quiseram que a escola pública fosse: o local onde o seu filho tem de ser melhor que o filho do outro; onde se secundariza a solidariedade, o diálogo, o espírito crítico, o respeito pelo outro; onde o que vale é a classificação para a universidade, não o cidadão preparado para intervir activa e eficazmente na sociedade. O Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, tão próximo, quando ouvimos Trump e os seus acólitos da extrema direita espalhados pelo mundo e suportados por Putin. As elites a definirem as regras duma escola onde os seus filhos não andam…

Cuidado com as trombetas!

Já viram algum governante do mundo morrer, ou ficar amputado, ou cego, ou louco, nas guerras que forjam, no ódio que fomentam?

A minha geração nasceu numa ditadura, teve uma guerra colonial em África, durante doze anos, na defesa dos interesses de muito poucos. Conheceu o sofrimento, a doença, a perda de membros, a morte, mas também as prisões, o exílio, o silêncio e a perseguição no emprego.

Resistiu e mudou este país.

O seu lugar continua a ser onde se ama e se sofre, onde se combate e se luta pela democracia, a liberdade, a justiça, o direito à igualdade. Umas vezes recua-se, outras avança-se. Mas não há retrocesso. A vida é militância.

Não sei se por causa das minhas origens ou simplesmente da minha natureza, há em mim algo, muito forte, que me liga a árvores, a plantas, a flores, a animais, a espaços verdes ou amarelos e amplos ou exíguos, a serras mais ou menos elevadas, de onde as neblinas se descolam e evolam pelos céus, a pedras, pequenas ou pedregulhos, espalhadas ou juntinhas e a regatos e fontes que jorram espontaneamente.
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A crise das democracias liberais, que tanto e a tantos atormenta, pode residir num conflito entre a natureza humana e o regime democrático-liberal. Num livro de 2008, Democratic Authority – a philosophical framework, o filósofo David.
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Existe um paternalismo naqueles que desenvolvem uma compreensão do mundo extensiva que muitas vezes não lhes permite ver os outros, quiçá a si próprios, como realmente são. A opinião pública tem sido marcada por reflexões sobre a falta de memória histórica como justificação do novo mundo intolerante que está para vir, adivinho eu, devido à intenção de voto que se espera no CHEGA.
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Escreve Jorge Carreira Maia, nesta edição, ter a certeza de que este mundo já não é o seu e que o mundo a que chamou seu acabou. “Não sei bem qual foi a hora em que as coisas mudaram, em que a megera da História me deixou para trás”, vai ele dizendo na suas palavras sempre lúcidas e brilhantes, concluindo que “vivemos já num mundo tenebroso, onde os clowns ainda não estão no poder, mas este já espera por eles, para que a História satisfaça a sua insaciável sede de sangue e miséria”.
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O dia 5 de Fevereiro de 2032, em que o Francisco Falcão fez 82 anos - aos quais nunca julgara ir chegar -, nasceu ainda mais frio do que os anteriores e este Inverno parecia ser nisso ainda pior que os que o antecederam, o que contribuiu para que cada vez com mais frequência ele se fosse deixando ficar na cama até mais tarde e neste dia festivo só de lá iria sair depois do meio-dia.
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Há dias atrás, no âmbito da pré-campanha eleitoral, visitei o lugar onde passei a maior parte da minha vida (47 anos), as oficinas da CP no Entroncamento.

Não que tivesse saudades, mas o espaço, o cheiro e acima de tudo a oportunidade de rever alguns companheiros que ainda por lá se encontram, que ainda lá continuam a vender a sua força de trabalho, foi uma boa recompensa.
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Quando me aborreço, mudo de canal. Vou seguindo os debates eleitorais televisivos, mas, saturado, opto por um filme no SYFY, onde a Humanidade tenta salvar com seus heróis americanizados da Marvel o planeta Terra, em vez de gramar as notas e as opiniões dos comentadores profissionais e partidocratas que se esfalfam na crítica ou no elogio do seu candidato de estimação.
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“Quando somos crianças, perguntamos sempre porquê, mas os adultos esquecem-se de continuar a perguntar. Limitam-se a aceitar.”

Colum McCann in Apeirogon

Na citação acima podemos encontrar a explicação para a passividade face aos desastres ambientais revelada pelas gerações menos jovens.
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Este é o meu único mundo! - antónio mário santos

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08.03.2024

Comentava João Carlos Lopes , no último Jornal Torrejano, de 16 de Fevereiro, sob o título Este Mundo e o Outro, partindo, quer do pessimismo nostálgico do Jorge Carreira Maia (Este não é o meu mundo), quer da importância da memória, em Maria Augusta Torcato, para resistir «à névoa que provoca o esquecimento e cegueira», quer «na militância política e cívica sempre empenhada», da minha autoria, num país do salve-se quem puder e do deixa andar, sempre à espera dum messias que resolva, por qualquer gesto milagreiro, a sua raiva abafada de nunca ser outra coisa que a imagem crónica de pobreza.

Quer nos citados, que no autor da crónica, há uma visão de desencanto do futuro, não apenas do país, mas da Europa. A sua evolução, no século XX, não foi brilhante: desde a primeira guerra mundial, colonizada pelos Estados Unidos da América, na economia, nas tecnologias, na cultura, na mentalização informativa dos media, assentes nos princípios neoliberais duma democracia que nunca conseguiu ultrapassar a consciência protestante da desigualdade, da xenofobia e do racismo, que lhe foi base de estrutura económica e social nas migrações dos colonizadores provenientes da Europa e, sobretudo, da Inglaterra.

Reconhece-se, por outro lado, que a desestabilização do ambiente planetário resulta da manutenção, há séculos, duma sociedade assente na acumulação do capital, na desigualdade do trabalho, no uso da mão de obra escrava ou sujeita ao limiar da miséria, que, nem o liberalismo do século XIX, nem as revoluções proletárias do século XX, conseguiram alterar de forma profunda.

Ainda hoje, EUA, Rússia e China, ditam as ordens dessas novas repúblicas de escassa democracia do designado Terceiro Mundo, onde às populações se coloca um dilema existencial: ou se submetem, ou emigram.

Percebo que a idade e a mudança vão gerando, sob a pressão crescente da inquietude e, mesmo, raiva, das juventudes sem nenhuma garantia duma vida decente, uma angústia existencial ante a visão dum mundo em que se acreditara poder viver em paz e com dignidade, se estar a desintegrar como um castelo da cartas.

Mas, tudo o que hoje acontece, era legível há mais de 30 anos. Os cientistas já então apontavam que a sociedade de consumo iria consumir tudo, degradar a possibilidade da vida planetária

O desencanto de hoje é o resultado duma opção mundial pela extracção, até ao impossível, dos recursos planetários, para satisfação dos prazeres comodistas das sociedades contemporâneas que, entregues aos seus lazeres, queriam melhores vencimentos, melhores casas, melhores automóveis, melhores instalações para férias, melhores produtos nas mesas das refeições, melhores instrumentos de comunicação e maior velocidade na transferência da informação.

Foi este desinteresse egoísta das classes médias que conduziu à sua própria sufocação. E viram os seus próprios filhos a sufocarem, devido às suas próprias opções. Criou-se uma juventude, como todas as outras, fruto das regras que, os que dominam, impõem à sociedade.

As de hoje, basicamente com o ensino secundário e, grande maioria, com o ensino superior, sente que o seu país lhe não dá as condições que desejam para viver com dignidade. E critica as gerações mais velhas por não conseguirem sair de casa dos pais, ou serem obrigados a emigrar por um vencimento melhor do que, para o mesmo trabalho, teriam na........

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