Marcelo Rebelo de Sousa discordou do conteúdo e da forma de dois diplomas sobre Saúde — mas promulgou-os. E Marcelo Rebelo de Sousa discordou da redacção do diploma da privatização da TAP — e vetou-o. Aconteceu na mesma semana, com ambas as decisões a serem anunciadas num intervalo de 3 dias — a 24 e a 27 de Outubro. Postas lado-a-lado, estas decisões realçam uma contradição: discordando em ambas as situações, Marcelo só vetou numa. Contudo, lendo as respectivas notas presidenciais, nessa contradição aprende-se que, afinal, o critério verdadeiramente determinante na ponderação do Presidente da República não assenta na redacção dos diplomas, mas sim no tempo.

A 24 de Outubro, a Presidência emitiu uma nota sobre a promulgação de dois diplomas sobre Saúde. Nessa nota, Marcelo desenvolve em quatro pontos as razões pelas quais tem dúvidas e discorda, na substância e na forma, dos dois diplomas em questão. Em consonância com essa argumentação, a lógica apontava para que Marcelo vetasse os diplomas. Mas é então que o Presidente da República anuncia a promulgação, apoiando-se num argumento original: admite que o seu veto presidencial seria inútil, apenas servindo para atrasar (ainda mais) o “mais de um ano perdido”, uma vez que o Governo poderia recorrer à Assembleia da República para nova aprovação e assim superar o veto presidencial. Ficou escrito mesmo assim: “(…) o Presidente da República entende não dever constituir travão – que, no fundo, só atrasaria o já atrasado, com eventual recurso, pelo Governo, à Assembleia da República para superar o veto presidencial –, pelo que promulgou (…)”.

A 27 de Outubro, a Presidência emite uma nota acerca do veto ao diploma sobre a privatização da TAP. Nessa nota, o Presidente da República solicita a clarificação de três aspectos que considera essenciais e em relação aos quais os esclarecimentos recebidos não foram satisfatórios. Em coerência, a sua decisão foi a de vetar o diploma. Mas, na sua comunicação, Marcelo insistiu num ponto-chave, nele justificando a sua decisão: este seu veto não atrasará nem prejudicará o processo de privatização da TAP, por dois motivos. Primeiro, porque estes pedidos de clarificação poderão ser rapidamente respondidos pelo Governo. Segundo, porque ele próprio devolveu o diploma ao Governo antes de esgotar o prazo que tinha para o apreciar. A formulação foi esta: “(…) Estas três questões específicas, mas cruciais, podem ser dilucidadas sem demasiadas delongas, isto é, sem prejuízo para a urgência do processo. Por isso, as suscito no dia imediato ao dos esclarecimentos do Governo e muito antes do termo do prazo constitucional para a promulgação (…)”.

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Marcelo não gosta de estar em posição de fraqueza

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02.11.2023

Marcelo Rebelo de Sousa discordou do conteúdo e da forma de dois diplomas sobre Saúde — mas promulgou-os. E Marcelo Rebelo de Sousa discordou da redacção do diploma da privatização da TAP — e vetou-o. Aconteceu na mesma semana, com ambas as decisões a serem anunciadas num intervalo de 3 dias — a 24 e a 27 de Outubro. Postas lado-a-lado, estas decisões realçam uma contradição: discordando em ambas as situações, Marcelo só vetou numa. Contudo, lendo as respectivas notas presidenciais, nessa contradição aprende-se que, afinal, o critério verdadeiramente determinante na ponderação do Presidente da República não assenta na redacção dos diplomas, mas sim no tempo.

A 24 de Outubro, a Presidência emitiu uma nota sobre a promulgação de dois diplomas........

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