Saúde, educação, justiça casas demasiado caras, uma economia apoiada em sectores de baixa produtividade, como o turismo, serviços públicos que se demitem de abrir as portas para as pessoas e um Estado capturado por oito anos de governo de António Costa são apenas alguns dos problemas com que se vai defrontar o próximo primeiro-ministro, seja ele Luís Montenegro, seja Pedro Nuno Santos. E poderá ainda enfrentar um enquadramento global muito mais desfavorável, com um sério risco de um conflito a envolver os países da União Europeia.

Os portugueses parecem ter consciência do mau estado em que estamos. Se levarmos em conta os resultados do estudo de opinião do ICS e do ISCTE para a SIC e o Expresso, 71% considera que o país está a ir pelo caminho errado e 60% afirma que é tempo de mudar o que, como diz Pedro Magalhães que lidera este trabalho, pode querer dizer coisas diferentes para pessoas diferentes.

Como várias vezes se escreveu aqui, estes últimos oito anos foram o tempo da oportunidade perdida, estando por perceber as razões. A pandemia e a guerra explicam apenas uma parcela mínima. Pode não ser por acaso que a campanha do PS resolveu retroceder mais dez anos, apontando baterias ao tempo da Troika e escusando-se a perceber que o país que os socialistas receberam em 2015 se deveu às políticas que se fizeram nesses tempos difíceis e que evitaram que tivéssemos sido uma segunda Grécia.

A razão mais importante para explicar por se fez tão pouco em tanto tempo pode estar relacionada com a prioridade que foi dada à redução do desequilíbrio orçamental, ao mesmo tempo que se queria agradar à esquerda, o que se traduziu nos valores mínimos de investimento público com as consequências que estamos a enfrentar agora.

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E a ser assim, o próximo Governo pode ter também um problema a resolver nas contas públicas que, afinal, podem não estar resolvidas. Reduzir o défice público degradando os serviços públicos não é resolver o problema, é reduzir a oferta de serviços cobrando o mesmo, como naqueles produtos em que se reduz a quantidade e se mantém o preço.

Os resultados eleitorais dir-nos-ão também até que ponto a sociedade está radicalizada. A campanha tem revelado alguns sintomas de radicalização, mas tal pode limitar-se à bolha dos militantes. Depois das eleições é preciso combater este entrincheiramento que não é saudável para sociedade e muito menos para o diagnóstico dos problemas e para o desenho das políticas económicas.

Os desafios que enfrentamos são de tal ordem que se exigem pensadores livres, sem temas que sejam tabus nem soluções que têm de respeitar primeiro a ideologia e só depois se focam nas pessoas. A Saúde tem de ser pensada com as pessoas no centro das preocupações dos políticos e não a debater se é público ou privado. O mesmo se passa com a Educação onde é preciso voltar a debater como educar, num tempo em que a Inteligência Artificial torna os métodos tradicionais obsoletos.

Na Justiça é urgente que se acabe com a percepção de injustiça, quer pela ideia de impunidade gerada pela incapacidade de levar para a frente os julgamentos como o do ex-primeiro-ministro José Sócrates ou o caso BES, quer pela imagem que o Ministério Público tem dado. Se este lado da Justiça degrada em especial a confiança nas instituições, os inacreditáveis atrasos na justiça administrativa e fiscal põem também em causa o Estado de Direito e afectam de forma muito significativa a competitividade e os investimentos das empresas.

Em termos gerais, as políticas públicas têm de ser mais amigas dos cidadãos e das empresas. A desburocratização e simplificação administrativa tem de ser uma prioridade, não apenas pela redução dos custos de contexto, mas também porque é a melhor forma de combater a corrupção.

Precisamos de crescer mais do que os dois por cento ao ano, precisamos de empresas de maior valor acrescentado para conseguirmos colocar a nossa economia num novo patamar, em que os salários são mais altos e os empregos mais qualificados. Esta é a única forma de contermos a sangria de cérebros para o estrangeiro a que estamos a assistir.

São enormes os desafios que esperam o novo Governo, seja ele liderado por Luís Montenegro ou Pedro Nuno Santos. Esperemos que não seja mais uma oportunidade perdida. Já perdemos muito tempo.

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Tempos difíceis para o novo Governo

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05.03.2024

Saúde, educação, justiça casas demasiado caras, uma economia apoiada em sectores de baixa produtividade, como o turismo, serviços públicos que se demitem de abrir as portas para as pessoas e um Estado capturado por oito anos de governo de António Costa são apenas alguns dos problemas com que se vai defrontar o próximo primeiro-ministro, seja ele Luís Montenegro, seja Pedro Nuno Santos. E poderá ainda enfrentar um enquadramento global muito mais desfavorável, com um sério risco de um conflito a envolver os países da União Europeia.

Os portugueses parecem ter consciência do mau estado em que estamos. Se levarmos em conta os resultados do estudo de opinião do ICS e do ISCTE para a SIC e o Expresso, 71% considera que o país está a ir pelo caminho errado e 60% afirma que é tempo de mudar o que, como diz Pedro Magalhães que lidera este trabalho, pode querer dizer coisas diferentes para pessoas diferentes.

Como várias vezes se escreveu aqui, estes últimos oito anos foram o tempo da oportunidade perdida, estando por perceber as razões. A pandemia e a guerra explicam apenas uma parcela mínima.........

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