“Sempre que falo com António Costa, aprendo.” A revelação, comovente, foi feita por Pedro Sánchez a 7 de janeiro de 2016. Pouco depois de o líder socialista português ter surpreendido o PSD e o mundo com a invenção da geringonça, o líder socialista espanhol veio a Lisboa, com subserviências e mesuras, tentar perceber qual era o truque e como é que ele se fazia. Sánchez precisava mesmo de aprender rapidamente: pouco antes, o Partido Popular tinha ficado em primeiro lugar nas eleições e o PSOE num triste segundo. Mariano Rajoy, que entendeu logo o que se preparava, atirou-lhe à cara no parlamento de Madrid: “O senhor descobriu em Portugal a fórmula milagrosa de afastar o PP. Reconheça que ficou deslumbrado com aquela solução. Deve ter pensado: se outros conseguiram, porque não eu?” Realmente, Pedro Sánchez tinha ficado deslumbrado e tinha pensado isso. Mas, para estas coisas, como para outras, não basta ter vontade — é preciso ter algum tipo de competência. E, na altura, isso faltou ao líder do PSOE.

Acontece, porém, que em política raramente se choca contra uma parede. Pedro Sánchez não conseguiu replicar a geringonça — a que os jornais espanhóis se referiam, sem imaginação, como “pacto a la portuguesa” —, mas acabou por criar, mais tarde, o chamado “governo Frankenstein”. A expressão, colorida, foi criada pelo socialista Alfredo Pérez Rubalcaba, crítico do secretário-geral do PSOE, e designa um executivo que junta retalhos de socialistas, de comunistas, de independentistas e de radicais de diversas proveniências numa mesma criatura política. Com essa mistura improvável mas eficaz, em 2020, pela primeira vez em largas décadas, Espanha teve uma ministra que era uma orgulhosa militante do Partido Comunista.

Agora, o jogo virou: em 2024, é o novo líder dos socialistas portugueses quem vai precisar de aprender com o líder dos socialistas espanhóis. Nesta pré-campanha eleitoral, Pedro Nuno Santos está a esconder e a silenciar os seus planos para o dia 11 de março caso consiga ter uma maioria de esquerda no Parlamento — não quer alarmar os eleitores pacatos e centristas que deram a maioria absoluta a António Costa. Mas a inescapável verdade é que a novíssima geringonça de Pedro Nuno Santos vai ser, na realidade, um governo Frankenstein. Não há outra saída: já não estamos em 2015, quando BE e PCP se entusiasmavam, numa infantil inocência, com a promessa de “virar a página da austeridade”. Com o passar dos anos, as sucessivas reviengas de António Costa mostraram aos dois os limites de um acordo com os socialistas que fique fechado na Assembleia da República e não entre no Conselho de Ministros. O PS minoritário caiu uma vez por causa disso e não se levantará novamente sem que isso esteja resolvido.

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O PS está pronto para fazer o governo Frankenstein

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20.01.2024

“Sempre que falo com António Costa, aprendo.” A revelação, comovente, foi feita por Pedro Sánchez a 7 de janeiro de 2016. Pouco depois de o líder socialista português ter surpreendido o PSD e o mundo com a invenção da geringonça, o líder socialista espanhol veio a Lisboa, com subserviências e mesuras, tentar perceber qual era o truque e como é que ele se fazia. Sánchez precisava mesmo de aprender rapidamente: pouco antes, o Partido Popular tinha ficado em primeiro lugar nas eleições e o PSOE num triste segundo. Mariano Rajoy, que entendeu logo o que se preparava, atirou-lhe à cara no parlamento de Madrid: “O senhor descobriu em Portugal a fórmula milagrosa de afastar o PP. Reconheça que ficou deslumbrado com aquela solução. Deve ter pensado: se outros conseguiram,........

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