Imediatamente a seguir ao 25 de Abril, como seria de esperar, começaram a pipocar partidos por todo o lado. Mas deu-se um facto surpreendente, tendo em conta que o país tinha acabado de sair de uma longa ditadura de direita: logo em agosto, a SEDES divulgou um estudo onde, para tentar pôr alguma ordem na confusão, classificava 48 partidos e concluía que 29 se situavam na esquerda e na extrema-esquerda e 19 iam do centro à extrema-direita. Ou seja: espantosamente, quase 40% dos partidos analisados escassos meses depois do fim do Estado Novo apresentavam-se como não sendo de esquerda.

Perante isto, os revolucionários começaram imediatamente a aplicar a “tática do salame”. A expressão é do político húngaro Matyos Rakosi, que, logo depois da Segunda Guerra Mundial, explicou como os partidos comunistas eliminavam, um a um, os poderes que os enfrentavam, cortando o “salame” de forma gradual, começando à direita e avançando depois para a esquerda. Seguindo essa receita infalível, em Portugal os partidos à direita foram sendo progressivamente ilegalizados. Muito rapidamente, o CDS de Diogo Freitas do Amaral sentiu que a faca estava próxima. Procurando ajuda, implorou por uma adesão urgentíssima à União Europeia das Democracias Cristãs. Acompanhado por Adelino Amaro da Costa, correu para Paris e apelou: “Acham que podemos ser admitidos na UEDC já nesta reunião? Para nós, é absolutamente indispensável obter uma proteção internacional, pois está em marcha um processo de salamização que já destruiu três partidos, e nós seremos a próxima vítima”. Na avaliação posterior do próprio Freitas do Amaral, só a presença de uma delegação da UEDC no primeiro congresso do partido, no Palácio de Cristal, no Porto, impediu que uma tentativa de invasão acabasse com o esmagamento do CDS.

A diabolização de qualquer político que não seja de esquerda não foi apenas uma caraterística passageira do processo revolucionário — na verdade, transformou-se numa marca do regime. Poucos anos depois, Francisco Sá Carneiro também foi repetidamente descrito como um radical que pretendia o regresso da ditadura, especialmente quando se atreveu a apresentar o general Soares Carneiro como candidato presidencial contra o sacrossanto (e também general) Ramalho Eanes.

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Pedro Nuno Santos aplica a "tática do salame"

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18.11.2023

Imediatamente a seguir ao 25 de Abril, como seria de esperar, começaram a pipocar partidos por todo o lado. Mas deu-se um facto surpreendente, tendo em conta que o país tinha acabado de sair de uma longa ditadura de direita: logo em agosto, a SEDES divulgou um estudo onde, para tentar pôr alguma ordem na confusão, classificava 48 partidos e concluía que 29 se situavam na esquerda e na extrema-esquerda e 19 iam do centro à extrema-direita. Ou seja: espantosamente, quase 40% dos partidos analisados escassos meses depois do fim do Estado Novo apresentavam-se como não sendo de esquerda.

Perante isto, os revolucionários começaram imediatamente a aplicar a........

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