Uma grande parte dos apoiantes de Trump, nos EUA, é constituída por cristãos protestantes, evangélicos. Ora os evangélicos não querem distinguir entre o que é da fé religiosa e o que pertence à política, ao Estado. Uma tal posição não encontra um terreno favorável nos EUA, até por motivos históricos.

Como nesta coluna já referi, ainda antes da independência americana muitos dos que tinham fugido da Europa, para escaparem às guerras religiosas, decidiram não falar em público de religião, que assim passou a ser matéria do foro íntimo de cada um. Deste modo conseguiu-se evitar que ela dividisse as pessoas, a ponto de se matarem umas às outras.

Na Europa, as coisas passaram-se de outra maneira. A Igreja católica foi durante séculos combatida em nome das “luzes”, por vezes de forma violenta. A Igreja, por sua vez, declarava-se hostil ao iluminismo. E criticava, por exemplo, as ideias evolucionistas de Darwin, teorias que desejava afastar do ensino público. Esta situação de conflito perdurou até ao séc. XX, tendo sido ultrapassada, da parte da Igreja, pelo Concílio Vaticano II.

Quando, cerca de um ano depois de ter sido proclamada a República em Portugal, em 1911 surgiu uma lei de separação entre a Igreja e o Estado, os católicos portugueses sentiram-se agredidos. A sanha anti-religiosa de alguns políticos republicanos tornara essa lei um meio legal de o Estado laico interferir acintosamente na atividade da Igreja católica. Erro que Mário Soares teve o cuidado de evitar.

Hoje, porém, a Igreja em Portugal, assim como em França e noutros países europeus, aprecia a separação com o Estado e de modo nenhum pretende regressar ao séc. XIX, quando as autoridades civis controlavam as atividades eclesiásticas em nome do cristianismo, religião de Estado.

Trump é uma muito séria ameaça à democracia na América. Mas não creio que no plano das relações entre Estado e confissões religiosas haja muito a recear de uma vitória eleitoral de Trump em novembro do corrente ano.

QOSHE - ​Religião e política - Francisco Sarsfield Cabral
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​Religião e política

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22.01.2024

Uma grande parte dos apoiantes de Trump, nos EUA, é constituída por cristãos protestantes, evangélicos. Ora os evangélicos não querem distinguir entre o que é da fé religiosa e o que pertence à política, ao Estado. Uma tal posição não encontra um terreno favorável nos EUA, até por motivos históricos.

Como nesta coluna já referi, ainda antes da independência americana muitos dos que tinham fugido da Europa, para escaparem às guerras religiosas, decidiram não falar em público de........

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