O Ocidente está a ser varrido por uma onda de populismo sem precedentes. Se descontarmos o período entre as grandes guerras mundiais, com a ascensão dos fascismos e do nazismo, nunca a extrema-direita populista teve tanta penetração e poder.

A recita populista é simples e muito antiga: prometer, aos berros, soluções simples para problemas complexos, nunca resolvendo nada, antes criando problemas novos e agravando os antigos.

Costuma dizer-se que o populismo se alimenta do descontentamento, e a ressaca da Grande Depressão de 1929-33 foi, de facto, um dos factores explicativos da adesão popular ao nazismo.

Porém, no Ocidente do séc. XXI, nada aconteceu de comparável à crise de 1929-33. Certo que houve a crise do sub-prime de 2008 e a subsequente crise das dívidas soberanas. Houve, mais recentemente, a pandemia a e crise inflacionista. Tem havido políticas de austeridade desadequadas.

Mas a tendência de crescimento do PIB no Ocidente é positiva, o emprego tem tido um comportamento aceitável, as populações estão mais instruídas que nunca e têm uma esperança média de vida muito superior à dos anos 30 do séc. XX. Mais, se olharmos para alguns dos países onde as pessoas se dizem sentir mais felizes, como a Finlândia, a Suécia, os Países Baixos, a Suíça ou a Alemanha, vemos partidos da extrema-direita populista no poder, ou perto dele. Como associar isso a descontentamento, se estes países estão no top da felicidade mundial?

Parece-me que temos de perceber o seguinte: o que está a falhar, até nesses países, é a capacidade de continuar a melhorar, verdadeiramente, a vida das pessoas e a sua esperança no futuro. Não basta o PIB crescer. É preciso que o salário do indivíduo mediano cresça; é preciso que a desigualdade não aumente; é preciso gerir o multiculturalismo; é preciso que os preços das habitações não se tornem proibitivos (quando a causa profunda disso é a globalização e a livre circulação de capitias); é preciso que a sociedade gere os empregos adequados às qualificações das pessoas.

Enfim, o populismo será sempre um inimigo muito poderoso: com a retórica, a mentira e o desplante, promove o empolgamento, alija responsabilidades individuais e encobre os problemas difíceis. E mesmo as pessoas mais felizes do mundo são permeáveis. Mas é responsabilidade de quem tem governado as nações encontrar respostas para uma espécie de frustração subliminar que está a alimentar o monstro populista. Caso contrário, ainda acabamos devorados por ele.

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Felicidade e populismo

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16.01.2024

O Ocidente está a ser varrido por uma onda de populismo sem precedentes. Se descontarmos o período entre as grandes guerras mundiais, com a ascensão dos fascismos e do nazismo, nunca a extrema-direita populista teve tanta penetração e poder.

A recita populista é simples e muito antiga: prometer, aos berros, soluções simples para problemas complexos, nunca resolvendo nada, antes criando problemas novos e agravando os antigos.

Costuma dizer-se que o populismo se alimenta do descontentamento, e a ressaca da Grande Depressão de 1929-33 foi, de facto, um dos factores explicativos da adesão popular ao nazismo.

Porém, no Ocidente do séc. XXI, nada aconteceu de comparável à crise de 1929-33. Certo que houve a crise........

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