Pode-se olhar para o resultado das eleições do passado domingo e dizer que há uma larguíssima maioria de portugueses que ainda acredita na democracia liberal e nos seus valores fundamentais. Concluir apenas isto seria como contar aquela história do homem que está a cair de um arranha-céu e a meio da queda diz que por enquanto está tudo bem. No mesmo sentido, e como me dizia um familiar próximo, permanecer simplesmente na constatação de que há mais de um milhão de portugueses que quer um partido contrário aos princípios democráticos no poder é ajudar esse partido. Compreendo o choque, mas não há nada de extraordinário ou excecional no enorme crescimento do Chega.

Em primeiro lugar, corresponde a um fenómeno global. Países como os EUA, Brasil, Hungria, Holanda, Espanha, Suécia, etc., etc., têm os seus Venturas, uns mais habilidosos do que outros. O descontentamento com a democracia liberal está muito longe de ser um exclusivo português e até é superior em países com condições de vida bem superiores às nossas. O discurso utilizado é basicamente o mesmo. As nuances são em função da realidade local. A ênfase dada varia de país para país e vai da imigração à corrupção, passando pela insegurança, pelo nacionalismo e pelas questões de costumes, mas o corpo central é comum. Apresentam-se sempre soluções simples para problemas muito complexos: fechar fronteiras, meter os aparentemente corruptos nos calabouços, sem mais, mandar a polícia disparar primeiro e falar depois e por aí fora. Sem imigrantes, com o dinheiro que se iria buscar à corrupção, acabando com a entrega de dinheiro aos imaginários subsidiodependentes e com os bandidos todos na cadeia, as pessoas que têm vidas muito difíceis, que não veem perspetivas para os filhos, que ganham salários de miséria e que têm serviços públicos deficientes veriam os seus problemas resolvidos.

QOSHE - O que fazer? - Pedro Marques Lopes
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O que fazer?

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15.03.2024

Pode-se olhar para o resultado das eleições do passado domingo e dizer que há uma larguíssima maioria de portugueses que ainda acredita na democracia liberal e nos seus valores fundamentais. Concluir apenas isto seria como contar aquela história do homem que está a cair de um arranha-céu e a meio da queda diz que por enquanto está tudo bem. No mesmo sentido, e como me dizia um familiar próximo, permanecer simplesmente na constatação de que há mais de um milhão de........

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